Apresentação



O presente blog foi criado em Janeiro de 2005. Está em actualização permanente, tal como o seu autor, que decidiu agora regressar ao estudo do Direito. Tem como linha de orientação não comentar processos ou casos concretos, menos ainda o que tenha a ver com a minha profissão, estando o meu site de Advogado aqui, nele se mantendo o mesmo critério. Estou presente também na rede social Linkedin e no Twitter.

José António Barreiros




Europa: a fortaleza desmorona-se


Sempre fui um euro-céptico e, ironizando, disse um dia que me recusava a saber Direito Europeu para exercer a minha profissão porque talvez este terminasse antes de eu chegar ao fim da minha vida activa como advogado. Neste contexto, fui convivendo como pude, com má vontade e sem convicção, com o galopante fenómeno da europeização da vida jurídica portuguesa.
A descrença teve menos a ver com o dito "Direito" provindo das instituições europeus, que na sua esmagadora e torrencial produção se traduz em regulamentos, ansiosos de, em lógica totalitária, abrangerem a mais ínfima parte da vida social dos países, mas com a estrutura política que deu azo ao mesmo, em crescente centralização a caminho de uma unidade bancária e de um governo supra-nacional, tudo sem que os povos abrangidos fosse ouvidos sequer sobre tal opção, que significasse pura e simplesmente a perda do núcleo essencial das soberanias nacionais..
Ora assim como o Direito não legitimado pela democracia não é um Direito justo, assim terá de estar desprovido de legitimação substancial tudo quanto proveio das instituições europeias. Isto para quem não tome como um conceito relativo a noção de Estado de Direito Democrático e não conviva os princípios em função das circunstâncias.
Em contra-ciclo, ante os escombros dessa realidade condenada desde o ovo ao fracasso - uma Europa do capital, baseada na aglutinação de interesses divergentes, desproporcionada entre o Norte e o Sul, e assolada por crises que não sabe resolver - eis que surge agora a democracia sob a forma da bandeira referendária, tida, aliás, por subversiva pelos próceres do sistema, o que evidencia bem a contradição que a tudo subjaz.
O impacto da saída da Grã-Bretanha da União Europeia está mais do que demonstrado, dois anos que demore a agonia da sua materialização, ou mesmo que negociações lhe reduzam o impacto. Só a ingenuidade leva a que se julgue que os efeitos negativos serão residuais. Também aqui a des-legitimação em que tudo ocorre se evidencia: ante o pavor que a saída gera na continuidade do sistema e nos interesses propriamente britânicos já há quem -  milhões de assinatura ao iniciar-se a semana - tente fazer passar a ideia de um novo referendo. Como se a democracia fosse boa e válida só quando nos calha.
Neste panorama, numa lógica cínica há escritório internacionais de advocacia a saudarem o cenário, vendo no caos fonte de receitas pelo acréscimo de trabalho; mas mesmo descontando os estados de alma insalubres, na manhã em que se tornou conhecido o tangencial e inesperado resultado britânico, duas realidades surgiram no cenário da advocacia.
Primeira, uma prevenção: de ora diante, comentou-se, a única resposta séria que se pode dar a qualquer questão que envolva uma previsão de resultado é «talvez!».
Segunda, os escritórios que integram o "círculo mágico" britânico reuniram, tal como muitos congéneres, incluindo os sediados no além Atlântico para preparem a resposta a darem aos seus constituintes que de imediato os inundaram com questões quanto ao modo de gerirem legalmente o cenário que se aproximava. Alguns organizaram linhas telefónicas de atendimento vinte e quatro horas por dia.
Ante o Brexit e o que se lhe seguir, um mundo de incerteza aproxima-se. Mais do que já existia. A fortaleza europeia desmorona-se. A lição a tirar será à à conta das gerações futuras.

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Faculdade de Direito: 50 anos depois!


A quantos puderem difundir a notícia, desde já os nossos agradecimentos. Estou a organizar a comemoração, na forma de um jantar, dos cinquenta anos de entrada na Faculdade de Direito de Lisboa. Ocorreu em 1966. 
O evento terá lugar na Faculdade já no próximo dia 17 (Junho), pelas 19:30. 
A inscrição pode ser efectuada através do email fdl50@mail.com ou pelo telefone 21 7936183 (entre as 10:00 e as 18:00).

Robin Hood & o Cavaleiro Branco


Poderia citar normas jurídicas, ensaios doutrinais, decisões jurisprudenciais, mas creio que o enunciado do tema é já um princípio de resposta. Não tomo posição quanto ao assunto, apenas o traga para a praça da reflexão.
Surgiu inopinadamente uma nova categoria jurídica: tínhamos o denunciante anónimo, o suposto "arrependido",  o delator, o infiltrado, o informador.
Surgiu agora o "lançador de alerta". Usa documentos obtidos de modo ilícito, difunde-os através dos meios de comunicação e redes sociais. Obtém aplauso público e abre a porta a investigações processuais. E é tomado como desempenhando uma meritória função pública em prol da comunidade.
O conceito de notícia de infracção a partir de fontes ilícitas está assim adquirido. O conceito segundo a qual a prova obtida por intrusão ilegítima em sistema informático, por furto ou por desvio de documentos, não é proibida como índice de crime está ganho.
Um admirável mundo novo surge no Direito Processual Penal.
No caso vertente, o Estado fiscal, carente de receitas, todos os Estados com orçamentos em baixa, encontram modo de recuperar receitas perdidas.
Inicia-se hoje no Luxemburgo o julgamento do Luxleaks. Como titula um jornal económico [ver aqui] trata-se de um julgar algo situado entre o Robin dos Bosques e o Cavaleiro Branco.

O Provedor de Justiça visita a "Penitenciária"


O Provedor de Justiça visitou no dia 19 de Janeiro de 2016, pelas 10h:45m o Estabelecimento Prisional de Lisboa, vulgo Penitenciária,dando assim início ao projecto O Provedor de Justiça, as prisões e o século XXI: diário de algumas visitas.

No seu estilo próprio, literário, abre o relatório [que pode ler-se aqui] com a frase «O céu estava enfarruscado. Praticamente não estava ninguém à porta, não havia filas de pessoas» e termina-o com «13h:00m – Saí. O céu continuava escuro mas com raios de sol. E, tal como à entrada, inexistiam pessoas para entrar naquele microcosmo comunitário que é, simultânea e paradoxalmente, nosso e alheio e que, como todos sabemos, se espelha em refrações que a sociologia não deixa de classificar como totalizantes». Duas horas de visita, pois.

Conclusão geral do que observou e lança no relatório: «Um sentimento assola o espírito do Provedor de Justiça. Um sentimento sustentado em dados e em experiência vivida. Não um estado de alma. E esse sentimento pode traduzir-se no seguinte: é urgente fazer uma de duas coisas. Ou fazer de raiz um outro Estabelecimento Prisional de Lisboa, o que parece ter sido a razão primeira que levou à venda do já referido estabelecimento prisional, ou levar a cabo obras profundíssimas no atual estabelecimento. A dignidade humana, a defesa intransigente dos direitos fundamentais mais comezinhos – e, neste sentido, porque fundamentais nunca podem ser comezinhos –, a compaixão para com o outro, o respeito para com o outro não podem – nem devem – permitir que, não obstante toda a situação de crise económica ou financeira, pessoas, muito embora no cumprimento devido e legítimo de pena privativa da liberdade, possam estar em situações objetivamente tão desumanas. 13h:00m – Saí. O céu continuava escuro mas com raios de sol. E, tal como à entrada, inexistiam pessoas para entrar naquele microcosmo comunitário que é, simultânea e paradoxalmente, nosso e alheio e que, como todos sabemos, se espelha em refrações que a sociologia não deixa de classificar como totalizantes.»

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Provedor de Justiça: relatório sobre a "Penitenciária"


O Provedor de Justiça visitou no dia 19 de Janeiro de 2016, pelas 10h:45m o Estabelecimento Prisional de Lisboa, vulgo Penitenciária,dando assim início ao projecto O Provedor de Justiça, as prisões e o século XXI: diário de algumas visitas.

No seu estilo próprio, literário, abre o relatório [que pode ler-se aqui] com a frase «O céu estava enfarruscado. Praticamente não estava ninguém à porta, não havia filas de pessoas» e termina-o com «13h:00m – Saí. O céu continuava escuro mas com raios de sol. E, tal como à entrada, inexistiam pessoas para entrar naquele microcosmo comunitário que é, simultânea e paradoxalmente, nosso e alheio e que, como todos sabemos, se espelha em refrações que a sociologia não deixa de classificar como totalizantes». Duas horas de visita, pois.

Conclusão geral do que observou e lança no relatório: «Um sentimento assola o espírito do Provedor de Justiça. Um sentimento sustentado em dados e em experiência vivida. Não um estado de alma. E esse sentimento pode traduzir-se no seguinte: é urgente fazer uma de duas coisas. Ou fazer de raiz um outro Estabelecimento Prisional de Lisboa, o que parece ter sido a razão primeira que levou à venda do já referido estabelecimento prisional, ou levar a cabo obras profundíssimas no atual estabelecimento. A dignidade humana, a defesa intransigente dos direitos fundamentais mais comezinhos – e, neste sentido, porque fundamentais nunca podem ser comezinhos –, a compaixão para com o outro, o respeito para com o outro não podem – nem devem – permitir que, não obstante toda a situação de crise económica ou financeira, pessoas, muito embora no cumprimento devido e legítimo de pena privativa da liberdade, possam estar em situações objetivamente tão desumanas. 13h:00m – Saí. O céu continuava escuro mas com raios de sol. E, tal como à entrada, inexistiam pessoas para entrar naquele microcosmo comunitário que é, simultânea e paradoxalmente, nosso e alheio e que, como todos sabemos, se espelha em refrações que a sociologia não deixa de classificar como totalizantes.»

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Indícios de conluio na contratação pública



Cito do site da Autoridade da Concorrência [ver aqui] os vários indícios podem alertar as entidades adjudicantes para a possibilidade de conluio num determinado procedimento de contratação pública. 

-» Indícios na apresentação de propostas 

 Número de propostas substancialmente inferior ao habitual ou ao expectável. 

 Algumas empresas retiram-se inesperadamente do procedimento. 

 A proposta vencedora é recorrentemente da mesma empresa, e outras empresas continuam a submeter propostas apesar de não serem bem-sucedidas. 

 Padrão de rotatividade da proposta vencedora entre os concorrentes. 

 Padrão de distribuição geográfica das propostas vencedoras. 

 Concorrentes habituais não apresentam propostas num procedimento no qual seria de esperar que o fizessem, continuando a concorrer em outros procedimentos. 

 Empresas apresentam propostas conjuntas, apesar de terem condições para apresentar propostas individuais. 

 Propostas diferentes que apresentam:  os mesmos erros (e.g., erros ortográficos, gramaticais ou de cálculo);  as mesmas lacunas face à informação requerida;  a mesma terminologia, em particular quando atípica;  a mesma formatação, grafia ou correções de última hora;  o mesmo papel timbrado, formulários semelhantes ou os mesmos dados de contacto;  carimbos de registo postal idênticos ou datas de receção, em mão, coincidentes ou, em caso de envio online, os mesmos endereços IP. 

-» Padrões suspeitos nas condições comerciais das propostas 

 Propostas diferentes com preços idênticos, em particular quando se mantêm idênticos durante um longo período de tempo. 

 Subidas uniformes de preços não explicadas por variações de custos. 

 Alinhamento súbito dos preços entre concorrentes. 

 Descida de preços quando entra um novo concorrente ou quando participa um concorrente não habitual. 

 Diferença inexplicável ou muito significativa entre o preço da proposta vencedora e o das demais propostas. 

 Diferenças de preço entre propostas são percentagens fixas ou montantes fixos. 

 Flutuações significativas nos preços apresentados pela mesma empresa em procedimentos diferentes sem justificação nos custos. 

 Eliminação de descontos que tradicionalmente eram concedidos. 

 Propostas que apresentam números decimais onde seria de esperar números redondos. 

 Preços das diversas propostas bastante mais elevados do que as estimativas de custos da entidade adjudicante. 

 Empresas locais apresentam preços para serviços locais superiores aos preços para regiões mais distantes. 

 Empresas locais e não locais apresentam custos de transporte semelhantes. 

 Manifestas semelhanças na calendarização e nas rubricas de custos entre propostas. Comportamentos suspeitos 

 Empresa vencedora subcontrata reiteradamente os demais concorrentes. 

 Empresa vencedora não aceita a adjudicação do contrato, vindo posteriormente a verificarse que foi subcontratada. 

 Apenas alguns dos concorrentes no procedimento solicitam orçamento a um fornecedor imprescindível para o contrato em causa. 

 Vários concorrentes subcontratam as mesmas consultoras no apoio à elaboração de propostas. 

 Uma empresa solicita os documentos do procedimento para si e para outro(s) concorrente(s).

 Uma empresa entrega a sua proposta em conjunto com a(s) de outro(s) concorrente(s).

-» Declarações suspeitas dos concorrentes 

 Propostas referem explicitamente propostas concorrentes ou a existência de acordo/concertação. 

 Exclusividade de uma área geográfica ou de um cliente a um concorrente. 

 Empresa não fornece determinada zona geográfica, determinado(s) cliente(s) ou tipo de produto/serviço, apesar de ter condições para o fazer. 

 Empresa justifica a sua proposta com referência a “tabelas de preços do setor”, “orientações de associações empresariais” ou outras expressões análogas. 

 Declarações de associações empresariais com referência detalhada a propostas. 

 Uma empresa tem conhecimento de propostas concorrentes ou de resultados da adjudicação ainda não divulgados. 

Os "Panama Papers"


A libertação de informação decorrente dos chamados Panama Papers por um consórcio internacional coloca inúmeras questões com recorte jurídico, a saber no que à investigação criminal respeita quanto a tais notícias:

-» Valor probatório de tais documentos, ainda que a nível indiciário ou de mera notícia de infracção, não conferidos que estão oficialmente com os originais, desmentida que tem sido a sua fidedignidade em alguns casos;

-» Valor das ilações que se podem extrair e extraem, nomeadamente na comunicação social, quanto ao que tais documentos podem significar, sucedendo que, numa lógica de mera associação de ideias tem passado a noção segundo a qual, evidenciando prima facie intuito de secretismo na guarda e movimentação do dinheiro, dali pode decorrer - por pura ilação - a suspeita tida por fundada, sem mais fundamentação, de que estão ao serviço de branqueamento de capitais, logo tendo como precedente crimes que têm sido ventilados como possíveis, desde a mera fraude e abuso de confiança fiscal até ao terrorismo e ao narcotráfico, sem esquecer a corrupção, o tráfico de armas e  a transmissão até de arte roubada pelos nazis.

Para além disso, no plano (re) construtivo, nada mais será igual e têm-se multiplicado, a nível dos Estados e organizações internacionais, iniciativas no sentido da modificação da legislação que:

-» Permite e regula os denominados paraísos fiscais, e a figura das offshores;

-» Regula o regime do segredo bancário e a obrigação de informação por parte dos Estados relativamente a informações e documentos pertinentes a investigações criminais solicitados ao abrigo da cooperação internacional;

-» Define os crimes de catálogo que legitimam a criminalização do branqueamento e a quebra do segredo bancário.

Num outro registo está em agenda o saber da legitimidade dos jornalistas recusarem cooperação com as autoridades judiciárias e/ou fiscais quanto às informações reveladas na comunicação social.

No imediato, temos duas vertentes claramente presentes: o núcleo essencial dos Estados que integram o G20, o G5 [Alemanha, Inglaterra, França, Itália, Espanha] caminha no sentido de implantar um sistema padronizado de registo e troca de informações sobre os BO's ou UBO's [beneficiários ou últimos beneficiários] de companhias que estejam situadas em países que estejam listados como paraísos fiscais; o próprio Panamá já admitiu, pela sua Vice-Presidente, que o caminho para a transparência, se tornou inevitável.

O que possa resultar em termos efectivos no campo legislativo, está para se ver. Para já, cada um dos Estados relativamente aos quais ocorrem revelações - que, é patente, estão a ser selectivas, o que já por si é uma questão interessante - estão a desencadear acções mais ou menos conseguidas no que se refere à revisão da situação financeira e fiscal dos visados. 

Ilegal é quando se viola uma norma, não um Código!


A minha vida profissional tem-me tirado imenso tempo e a vontade de me preparar para a mesma outro tanto. O que resta aplico-o em tudo quanto não é o Direito, pois há mais mundos para além da lei. E há a família, o mais importante que existe. E o eu-próprio, que também merece, nem que seja algumas horas de sono e o que o faça vencer o desânimo que o meio ambiente e até a Natureza teimam em querer infligir.
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Tudo isso gera como efeito em ter deixado de vir aqui e ter-se tornado notado o meu desejo de regressar, as minhas promessas de que voltarei, a minha ausência.
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Hoje, porém, ao ter lido o que abaixo copio, como que um imperativo cívico surgiu, o de não ser possível desarmar na atenção vigilante ao que sucede, o ser necessário evitar, nem que seja como um reparo, já que não com a simples divulgação, que certas coisas aconteçam ou se repitam ou ao menos aconteçam sem uma palavra indignada.
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Como escrevi numa rede social em que sou assíduo: «Eu nunca venho aqui por questões jurídicas. Mas ao ler agora mesmo isto concluo que em matéria de Direito devo ter perdido de vez o pé. Violar um artigo da lei é ilegalidade, ensinaram-me no primeiro ano do curso, tinha eu 17 anos. Agora, aos 67, aprendi, esta manhã, que aplicar um código em vez de outro...depende...!».
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É que, de facto, não é possível pensar de outro modo, depois de ter lido isto, aqui: «Ac. do S.T.A. 2/2016 - Uniformiza a jurisprudência nos seguintes termos: A circunstância do processo disciplinar movido a uma funcionária da Caixa Geral de Depósitos ter seguido as normas do direito privado, e culminado na aplicação de um despedimento, em vez do devido regime de direito público, não é abstractamente causal da ilegalidade do acto sancionatório, só em concreto, através da comparação do que se fez e do que deveria ter sido feito, se poderá avaliar da legalidade desse acto punitivo.»

O Círculo Mágico, a 1300 €/hora

É um dos problemas que nunca encontrou definição objectiva, o montante dos honorários dos advogados em Portugal. Não há propriamente uma tabela oficial que os defina. Há critérios gerais orientadores, que fazem atender a vários factores, mas que têm o seu quê de relativo. Dado o contexto da economia global em que se vive e a cada vez maior predominância de grandes sociedades de advogados é, porém, um problema que ganha acuidade.

O Estatuto da Ordem dos Advogados estabelece nos seus artigos 105º e 106º o essencial quanto à matéria:

Artigo 105º

Honorários
1 - Os honorários do advogado devem corresponder a uma compensação económica adequada pelos serviços efetivamente prestados, que deve ser saldada em dinheiro e que pode assumir a forma de retribuição fixa.
2 - Na falta de convenção prévia reduzida a escrito, o advogado apresenta ao cliente a respetiva conta de honorários com discriminação dos serviços prestados.
3 - Na fixação dos honorários deve o advogado atender à importância dos serviços prestados, à dificuldade e urgência do assunto, ao grau de criatividade intelectual da sua prestação, ao resultado obtido, ao tempo despendido, às responsabilidades por ele assumidas e aos demais usos profissionais.

Artigo 106.º

Proibição da quota litis
1 - É proibido ao advogado celebrar pactos de quota litis.
2 - Por pacto de quota litis entende-se o acordo celebrado entre o advogado e o seu cliente, antes da conclusão definitiva da questão em que este é parte, pelo qual o direito a honorários fique exclusivamente dependente do resultado obtido na questão e em virtude do qual o constituinte se obrigue a pagar ao advogado parte do resultado que vier a obter, quer este consista numa quantia em dinheiro, quer em qualquer outro bem ou valor.
3 - Não constitui pacto de quota litis o acordo que consista na fixação prévia do montante dos honorários, ainda que em percentagem, em função do valor do assunto confiado ao advogado ou pelo qual, além de honorários calculados em função de outros critérios, se acorde numa majoração em função do resultado obtido.
Muitos acham razoável estimá-los em função de uma taxa horária. É critério que tem a vantagem da objectividade e o defeito de penalizar os advogados que sejam mais rápidos porque mais competentes e eficazes, os que, com menos tempo gasto alcançam um melhor resultado para os seus clientes.
Há, por outro lado, os que tentam valorar o critério do sucesso, estipulando-o como regra de cálculo, se bem que a deontologia e e lei impeçam, como se viu, o advogado de ser sócio do constituinte e assim quinhoar nos proventos do caso.
A situação não é confortável. Nem para quem tem de pagar porque nem sempre se defronta com situações expectáveis nem para quem recebe porque fica impossibilitado de de fazer estimativas seguras porque os casos podem tornar-se mais complexos do que se supunha.
A Ordem dos Advogados, quando é chamada a pronunciar-se, emite laudos, que são, afinal, perícias, mas que dão como pressuposto a verdade daquilo que o advogado diz ter sido o trabalho prestado e o tempo nisso implicado; em caso de discussão sobre o tema, as partes litigantes terão de ir discutir o assunto para tribunal.
Nos países de cultura anglo-americana a taxa horária é ainda o critério maioritário e os escritórios funcionam todos na base do time-sheet, uma folha de cálculo em que as horas de trabalho são computadas consoante 
A questão mais disseminada e que dá azo a mais questões tem, porém, a ver com o montante. Revelados publicamente os valores causam sempre reprovação, Mas se comparados com as taxas praticadas pelos auditores, nomeadamente de firmas de primeira linha, pode dizer-se que na generalidade ficam muito aquém.
A situação vive da desregulação em que imperam as regras da concorrência, só que estas sujeitas à dominação dos escritórios que podem impor as regras.
Este relatório [ver aqui], oriundo do britânico Centre for Policy Studies [ver mais aqui] é concludente. 
Os valores que indica estão a ser objecto de comentários críticos, nomeadamente por porem em causa o próprio acesso à justiça. Com os honorários dos advogados britânicos do chamado Círculo Mágico [la crème de la crème dos escritórios de advocacia, ver aqui a definição] a atingirem 13 00 € [1 000 £], com médias entre as 700 e as 900 libras por hora trata-se de um verdadeiro cartel de justiça para poucos.

O ilícito dito de "mera" ordenação social


A princípio, visto do ponto de vista ingénuo das meras categorizações jurídicas abstractas, parecia lógico e isento de problemas de maior, tinha a sedução do que ainda não se vira pelo ângulo dos efeitos práticos e preenchia a necessidade de racionalização dos que supõem o Direito como um teorema da geometria.
Nessa altura o teoria do Direito Criminal fazia-o recuar para as zonas subsidiárias que o tornavam algo de fragmentário no campo do Direito punitivo, subsidiário, enfim - para usar uma expressão latina clássica a ultima ratio - no campo da repressão, algo que só entraria em acção quando e na medida em que estivessem em causa valores e interesses - bens jurídicos se lhes chamou a partir de então - com consagração constitucional.
Eram tempos em que a categoria das contravenções, pertencendo como coisas menores ao domínio do Direito Penal, pareciam no campo substantivo um excesso para este, e no campo das competências judiciárias e do processo, uma sobrecarga, incongruentes, em suma, com a valia e a solenidade que presidiriam por essências ao que do Direito Penal se reclamasse. E daí que tivessem de ser dele expurgadas e substituídas por algo de diverso.
Veio assim, sugestivo, o universo das contra-ordenações, ilícitos de cunho estritamente administrativo e as coimas, sanções pecuniárias que no seu âmbito se poderiam aplicar. Era assim na Alemanha e isso valia como critério de legitimação a quantos no Direito se reviam em tudo o que de germânico houvesse, ainda que discrepante com a nossa cultura ou com o nosso tipo de sociedade, ou com a globalidade do nosso sistema jurídico.
O ilícito de mera ordenação social fez assim a sua entrada como forma de punir, uma outra forma acrescida de punir, que rapidamente se espraiou pelos sectores das actividades de cunho patrimonial, financeiro, mas não só, afinal em todos os campos em que a regulação administrativa se tornava necessária, como o da concorrência, o dos mercados, o financeiro, o bancário, o ambiente, o fiscal, e tantos e tantos outros.
Foi atribulada a sua aparição no nosso sistema jurídico: aprovado pelo Decreto-Lei n.º 232/79, de 24 de Julho [ver aqui], foi esvaziado e colocado no limbo da suspensão pelo Decreto-Lei n.º 411-A/79, de 1 de Outubro [ver aqui], pois que se tornava inviável torná-lo mera conversão automáticas das antigas contravenções e transgressões e sem encontrar as entidades públicas, a quem se destinava, providas de estruturas para a sua aplicação. Só entraria em vigor com o Decreto-Lei n.º 432/82, de 27 de Outubro [ver aqui a redacção em vigor]
Vista a realidade com os olhos desses tempos, início da década de oitenta, pareceria que doravante as realidades de menor censurabilidade social passariam a ser reprimidas por esse Direito Administrativo punitivo, através de um procedimento administrativo também adequado a este ramo jurídico, pautado pela ductibilidade formal, simplificação e celeridade; tudo garantido com controlo judicial das decisões. E que tudo se pautaria numa lógica de proporcionalidade de não intromissão excessiva nos direitos de defesa nem na liberdade patrimonial dos cidadãos.
Olhando hoje que panorama encontramos?
Primeiro, o valor elevadíssimo a que podem chegar as coimas, tornando-as, no ângulo prático, bem mais agressivas para o património dos cidadãos do que era suposto suceder naquele tipo de processo.
Segundo, o facto de o Direito Penal ter estado em expansão, abrangendo progressivamente territórios onde dificilmente se concebe a sua natureza supostamente subsidiária, cumulativamente com a repressão contra-ordenacional, ambas concorrendo para uma sobrecarga punitiva sobre a mesma realidade.
Terceiro, a circunstância de o procedimento contra-ordenacional, privado que está de garantias formais, servir amiúde de forma expedita de captação de prova para uso subsequente no processo penal; assim um processo em que o investigador é também acusador e julgador, torna-se, como se forma de processo justo, meio de obtenção de prova que acaba por ser incorporada no processo penal com as gravosas consequências daí decorrentes.
Dito de "mera" ordenação social este tipo de ilícito tornou-se, pois, num instrumento complementar e por isso acessório da repressão penal, com ela miscigenada na prática dos seus efeitos.

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Quadro: Pieter Brueghel, o jovem