Apresentação



O presente blog foi criado em Janeiro de 2005. Está em actualização permanente, tal como o seu autor, que decidiu agora regressar ao estudo do Direito. Tem como linha de orientação não comentar processos ou casos concretos, menos ainda o que tenha a ver com a minha profissão, estando o meu site de Advogado aqui, nele se mantendo o mesmo critério. Estou presente também na rede social Linkedin e no Twitter.

José António Barreiros




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Intercepções telefónicas: acesso


O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 3/2017 [publicado no Diário da República n.º 72/2017, Série I de 2017-04-11; relator Manuel Joaquim Braz, texto integral aqui] fixou jurisprudência no seguinte sentido: «A partir do encerramento do inquérito com dedução de acusação, o arguido, até ao termo dos prazos referidos no n.º 8 do artigo 188.º do Código de Processo Penal, tem o direito de examinar todo o conteúdo dos suportes técnicos referentes a conversações ou comunicações escutadas e de obter, à sua custa, cópia das partes que pretenda transcrever para juntar ao processo, mesmo das que já tiverem sido transcritas, desde que a transcrição destas se mostre justificada.»

Da fundamentação, respigamos os seguintes excertos, pois que elucidativos:

«[...] a interpretação do n.º 4 do artigo 89.º no sentido de contemplar a possibilidade do exame desses suportes em momento anterior àquele e fora da secretaria, sem qualquer vinculação, nomeadamente por quem nem é sujeito processual, seria incoerente, por não ter em conta a «unidade do sistema jurídico», como manda o n.º 1 do artigo 9.º do Código Civil, e ilógica, por desconsiderar a regra do n.º 3 do mesmo preceito, segundo a qual deve presumir -se «que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados». Deste modo, na hipótese colocada — a de os suportes técnicos das escutas fazerem parte do processo —, haveria que fazer uma interpretação restritiva do n.º 4 do artigo 89.º, no sentido de o exame do processo não abranger esses suportes.»

«A exigência de que o exame dos suportes técnicos pelo assistente e pelo arguido seja feito na secretaria e de que só lhes sejam entregues cópias das partes que pretendam transcrever para juntar ao processo visa minimizar o risco de divulgação de dados relativos a matéria reserva.»

«Deve ainda notar -se que o não acesso do arguido (e do assistente) aos suportes técnicos das escutas antes do encerramento do inquérito foi tido como assente pelo acórdão de fixação de jurisprudência n.º 13/2009 do Supremo Tribunal de Justiça, onde, a propósito da actividade atribuída ao Ministério Público durante o inquérito pelo n.º 7 do artigo 188.º, se afirma que, nessa fase, haja ou não segredo de justiça, ‘‘não há ainda acesso aos suportes técnicos por parte do arguido e do assistente, como decorre do n.º 8 do artigo 188.º” [Diário da República, 1.ª série, de 6 de Novembro de 2009, página 8371]. Reafirma -se, pois, que, relativamente aos suportes técnicos, o arguido só tem direito a que lhe sejam entregues cópias das partes das gravações que pretenda transcrever para juntar ao processo, em concordância com André Lamas Leite, que não vê neste ponto razão para controvérsia: ‘‘estabelece -se agora que a obtenção de cópias apenas pode ter por fito a transcrição de partes tidas por relevantes para serem juntas aos autos até ao termo do prazo para requerer a abertura da instrução ou para deduzir contestação” [ob. cit., página 652]. Isso não significa, porém, que não possa obter cópias de partes já transcritas por iniciativa de outro sujeito processual. Mas, porque «não é lícito realizar no processo actos inúteis», nos termos do artigo 130.º do Código de Processo Civil, aplicável ao processo penal por força do artigo 4.º do Código de Processo Penal, só poderá obter essas cópias se apresentar motivos que o justifiquem. Um desses motivos, admitido pelo acórdão recorrido, pode ser o da eventual desconformidade entre aquilo que consta dos suportes técnicos e aquilo que foi transcrito. Haverá também razão para transcrever conversações ou comunicações já transcritas no caso de o arguido pretender justificadamente que estas não se encontram suficientemente contextualizadas, como admite Carlos Adérito Teixeira [Escutas telefónicas: a mudança de paradigma e os velhos e os novos problemas, revista do CEJ, 1.º semestre 2008, n.º 9, página 268].»

"Escuta" a Advogados


Com o Tribunal de Estrasburgo, defensor, diga-se, dos Direitos do Homem, a viabilizar a escuta num caso de terrorismo [ver aqui], também no Brasil a questão da licitude da intercepção telefónica da conversa entre o advogado e o seu constituinte está em aberto, agora no domínio do Direito Criminal Comum. Citando:

«Recentemente, tem se observado o vazamento dessas conversas gravadas, especialmente aquelas havidas entre o investigado e seu advogado, visando macular essa relação profissional de desconfiança pela sociedade em geral. Ainda que tal prática seja extremamente imoral, esse artigo se voltará para questão correlata de maior importância: Pode a conversa gravada entre cliente e advogado ser utilizada como meio de prova no processo penal?
Recente julgado do Superior Tribunal de Justiça, datado de 27 de maio de 2014, nos autos do RMS 33.677 – SP, negou provimento ao recurso interposto por um escritório de advocacia que postulava pelo desentranhamento de interceptação telefônica onde foram captados diálogos havidos entre advogados daquele escritório com um investigado, tendo o tribunal justificado a manutenção daquela interceptação nos autos do processo sob o fundamento de que “não é porque o advogado defendia o investigado que sua comunicação com eles foi interceptada, mas tão somente porque era um dos interlocutores, não havendo, assim, nenhuma violação ao sigilo profissional”.Com a devida vênia, ousamos discordar da decisão proferida por aquela Egrégia Corte, uma vez que (...) [ler o texto integral aqui]

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Fonte da imagem: aqui

Intercepções e processo penal

Não são apenas as escutas telefónicas, mas as intromissões nos faxes, no correio electrónico. A violação da privacidade das comunicações - mesmo dos advogados - passou a ser forma fácil de investigação. O que está defendido pela porta blindada do segredo profissional tem acesso pela janela da intercepção. Tem, pois interesse esta obra de Rita Castanheira Neves, de que se cita o texto de apresentação, editada pela Coimbra Editora:

«Esta obra tem como mote traçar a natureza e o regime jurídico das intercepções no correio electrónico enquanto meio de obtenção de prova em processo penal. A confusa e conceptualmente desvirtuada redacção conferida ao artigo 189.º do Código de Processo Penal encontra se, assim, na pretensão original de explorar e ultrapassar as dificuldades prático jurídicas sentidas pelo intérprete da norma, bem como de assimilar e sistematizar os abusos na intromissão da privacidade e a violação do segredo das comunicações que a mesma permite. Para alcançar tal compreensão, faz-se uma primeira aproximação ao âmbito das comunicações electrónicas no direito processual penal, convocando, para o efeito, os desígnios constitucionais que se projectam como garantia da privacidade, ínsita a qualquer comunicação privada, bem como da palavra, da salvaguarda da inviolabilidade das comunicações e da autodeterminação informacional, de modo a aferir do alcance de cada uma das esferas de protecção implicadas».