Apresentação



O presente blog foi criado em Janeiro de 2005. Está em actualização permanente, tal como o seu autor, que decidiu agora regressar ao estudo do Direito. Tem como linha de orientação não comentar processos ou casos concretos, menos ainda o que tenha a ver com a minha profissão, estando o meu site de Advogado aqui, nele se mantendo o mesmo critério. Estou presente também na rede social Linkedin e no Twitter.

José António Barreiros




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Crimes contra a honra: actualidade e interacção social

Interpretação actualista dos conceitos jurídicos em função da interacção social em matéria de crimes contra a honra, por ponderação dos critérios de aferição da tipicidade vertidos em um estudo jurídico tida como referência na matéria, o ensaio de José Beleza dos Santos, publicado em 1959 sobre os crimes de difamação e injúria.

É este o este interessante passo do Acórdão da Relação de Lisboa de 04.12.2019 [proferido no processo n.º 4477/14.9TDLSB-3, relatora Adelina Barradas de Carvalho, texto integral aqui] onde é configurada a questão da actualidade como critério de validação interpretativa:

«O estudo de Beleza dos Santos citado pelo tribunal a quo (“Algumas considerações jurídicas sobre crimes de difamação e injúria”, Revista de Legislação e de Jurisprudência, Ano 92.º) é uma reflexão importante sobre os crimes contra a honra, tem resistido à erosão do tempo mas data de 1959 .
Mas o estudo data de 1959 e o crime em causa , tendo em conta uma série de factores perdeu alguma carga em certos pontos ganhando-a noutros. Ou seja, o crime de injúrias é um crime cultural, as palavras têm a força que os movimentos culturais e sociais assim como os contextos em que são proferidas, lhes dão.
Hans Welzel chama a esse factor de influência e modificação, interação social. E sofreu o desgaste imposto pela compatibilização do bem jurídico que tutela com outras liberdades que, entretanto, se foram afirmando e sedimentando (como seja a liberdade de expressão). Hans Welzel desenvolveu uma teoria limitadora do Direito, estabelecendo obstáculos à utilização arbitrária do sistema penal através de elementos retirado do mundo fático. Na lógica deste jurista e filósofo, que se deparou com as atrocidades de um Estado punitivo e dominador ao extremo cometendo mesmo atrocidades, o Direito está intimamente associado à realidade de modo que factualidade e norma se correlacionam.
Na verdade o Direito é algo de vivo e tem de se adaptar ás alterações, evoluções e mesmo involuções do dia a dia das vivências e condições humanas. Não queremos com isto dizer que a Honra vale menos hoje do que valia em 1959. Queremos dizer que se o conceito de honra se redimensionou ganhando peso em situações , noutras situações a noção de que não foi atingida é clara.»

Quem agravos faz com eles se perde...


Peças processuais de advogados levadas à estampa eram prática e, numa menor medida, ainda o são. Agora opúsculos de parte litigante levadas aos prelos são mais raros, porque nem sempre o interessado tem dotes de literato.
A particularidade do escrito em causa é que o demandado dava pelo nome de Camilo Castelo Branco e a História esqueceu o nome dos sucessos do editor do notável de São Miguel de Seide, Ernesto Chardron: Lugan & Genelioux, implicados em outras polémicas editoriais como esta com o Visconde de Correia Botelho.
Encontrei o agravo num desses alfarrabistas, já muito sovado pelo tempo e a ter de ser lido com delicadezas de antiquário. 
O caso em si a isto se resume: os agravantes invocavam o direito de propriedade de sobre o livro Boémia do Espírito - apreendido cautelarmente na tipografia - e mais ainda de três outras - Notas Biográficas de Luís de Camões, A Senhora Ratazzi e A questão da Sebenta - que tinham por «fraudulentamente vendidas» ao editor Eduardo da Costa Santos.
O interesse é o vernáculo do escritor, mordente e pugilista do verbo poupando menos o advogado dos autores - que, pelo mínimo, de «rabula» e «raposa jusperita» apoda - do que a estes próprios.
É o libelo do que se sente difamado com a acção que toma como calúnia a dar vigor à pena em texto dirigido «à opinião pública», isso «atendendo mais ao vexame da injúria do que à importância da personalidade dos difamadores me merecia».
Lê-se com o indesfarçável sorriso da troça. Tempos de travar ferro com estrondo no foro e na praça. Ontem como hoje.

Difamação: eximentes

Causas de justificação em concurso a excepção da verdade e o exercício de um direito no que ao crime de difamação respeita. A Relação de Coimbra, por Acórdão de 25.06.12 [relator Orlando Gonçalves, texto integral aqui] definiu que «independentemente da prova da “exceptio veritatis”, a imputação de juízos poderá sempre integrar a causa de exclusão da ilicitude ao abrigo do ao artº 31.º, n.º 2, al. b), do Código Penal, quando fiquem demonstrados factos concretos que sustentem os juízos ou que com base nos mesmos o agente tinha fundamento sério para, em boa fé, os reputar verdadeiros».
Fundamentando a sua asserção considerou o aresto que: «Existem margens de tolerância conferidas pela liberdade de expressão, que compreende não só a liberdade de pensamento, como a liberdade de exteriorização de opiniões e juízos. É o que decorre do art.37.º, n.º1 da Constituição da República Portuguesa, quando preceitua que "todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem descriminações".O direito à liberdade de expressão e crítica tem limites, como decorre do próprio n.º 3 do mesmo art.37.º da C.R.P, quando estabelece que "as infracções cometidas no exercício destes direitos ficam submetidas aos princípios gerais de direito criminal...".Nos termos do art.31.º , n.º 2 , al. b) do Código Penal , incluído na Parte Geral , não é ilícito o facto praticado no exercício de um direito.Há pois que conciliar o direito à honra e consideração com o direito à critica, pois um e outro , pese embora sejam direitos fundamentais , não são direitos absolutos , ilimitados .Em matéria de direitos fundamentais deve atender-se ao princípio jurídico-constitucional da proporcionalidade, segundo o qual se deve procurar obter a harmonização ou concordância prática dos bens em colisão, a sua optimização, traduzida numa mútua compressão por forma a atribuir a cada um a máxima eficácia possível.Até onde vai o exercício do direito e quando passa ele a ser ilegítimo? O art.334.º do Código Civil ao estatui que "é ilegítimo o exercício de um direito quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito".Uma definição idêntica não se encontra no Código Penal. Acompanhando o acórdão da Relação de Coimbra de 23 de Abril de 1998 diremos que "Há um sentir comum em que se reconhece que a vida em sociedade só é possível se cada um não ultrapassar certos limites na convivência com os outros . (...) . Do elenco desses limites ou normas de conduta fazem parte (regras) que estabelecem a “obrigação e o dever” de cada cidadão se comportar relativamente aos demais com um mínimo de respeito moral, cívico e social, mínimo esse de respeito que não se confunde, porém, com educação ou cortesia, pelo que os comportamentos indelicados, e mesmo boçais, não fazem parte daquele mínimo de respeito, consabido que o direito penal, neste particular, não deve nem pode proteger as pessoas face a meras impertinências"».

Post difamatório on line: responsabilidade do director

Baseando-se na especificidade da Internet a Corte de Cassação italiana excluiu, por decisão de 29.11.11 [texto integral aqui], a responsabilidade de um director pela publicação de um post difamatório. A obrigação de diligenciar a não publicação de material ofensivo da honra não se aplicaria neste caso.
 
Eis a lógica da decisão: «Ebbene, sostiene giustamente la Corte, le pubblicazioni e quindi i giornali on line non presentano i requisiti di cui sopra in quanto non presentano alcun supporto fisico e non è configurabile, quindi, alcuna attività di distribuzione dello stesso supporto. L’articolo on line viene diffuso attraverso la stessa pubblicazione in rete, che consente l’immediata e contestuale visualizzazione del contributo da parte della collettività di utenti. Ma esiste un secondo motivo, che porta senz’altro ad escludere l’applicabilità dell’art. 57 del c.p. nel caso di specie. Difatti, le stesse caratteristiche del mezzo telematico utilizzato rendono impossibile l’esercizio di un effettivo controllo da parte del direttore di un giornale on line. Si ricorda, difatti, che ad avere contenuto diffamatorio è stato il commento di un lettore che sfugge totalmente all’attività di controllo del responsabile del giornale. E’ evidente, quindi, che la disposizione in questione è stata concepita solo per la stampa cartacea tradizionale ed all’epoca il legislatore nemmeno immaginava i futuri sviluppi tecnologici».

Ofensa por publicitação da dívida

O administrador do condomínio afixou em lugar visível que o titular de uma certa fracção, cujo nome não individualizou, devia uma determinada quantia à administração do prédio. Agiu assim como forma de, por este meio, determinar o devedor ao cumprimento. O Acórdão da Relação do Porto, de 13 Julho 2011 [proferido no processo 6622/10, relator Luís Teixeira, divulgado pelo Jus Jornal] considerou que isso poderia integrar crime, de injúria e/ou difamação e recebeu a acusação. «Exigindo uma dívida através de um meio em que para além de se pretender cobrar a quantia devida se expõe o devedor publicamente numa situação vexatória, de humilhação, desnecessárias à boa cobrança da dívida, com certeza que se pode estar perante uma ofensa ao bom nome e honra da pessoa logo, pode estar em causa a prática de um crime», justificou..
Pergunto: e o Estado não afixa aqui a relação nominal dos devedores fiscais? Estará a difamar, impunemente?

Difamação eucarística

Sinal dos tempos, o facto: «O anúncio, durante a eucaristía, de que o assistente não contribuiu financieramente para a Comissão festas, encerrando claramente um juízo de valor depreciativo acerca do carácter do assistente, é ofensivo da sua honra e consideração», sentenciou a Relação de Guimarães no seu Acórdão de 01.06.11 [relator Kuís Ramos], revela o JusJornal, citando o aresto na íntegra para os seus assinantes.

A honra do "onoverole" Capo

É sentença da Corte Civil de Roma que absolveu o grupo editorial Espresso da acção que havia sido proposta por difamação, em 2009, por Silvio Berlusconi. Todo o texto aqui
Em causa um artigo publicado no jornal La Repubblica. O fundamento a defesa da liberdade de imprensa, do interesse público da satisfação do dever de informação, a liberdade de crítica e de crónica. Exemplar.