Apresentação



O presente blog foi criado em Janeiro de 2005. Está em actualização permanente, tal como o seu autor, que decidiu agora regressar ao estudo do Direito. Tem como linha de orientação não comentar processos ou casos concretos, menos ainda o que tenha a ver com a minha profissão, estando o meu site de Advogado aqui, nele se mantendo o mesmo critério. Estou presente também na rede social Linkedin e no Twitter.

José António Barreiros




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Sociedades, seus representantes: a responsabilização

 


Recentíssima publicação da Universidade Católica o livro, que se anuncia e natureza didáctica, compendia estudos que o seu autor vem efectuando no âmbito da responsabilidade nomeadamente criminal das pessoas colectivas, agora na óptica da responsabilização dos seus "dirigentes". 

Trata-se da sequência da obra publicada em 2009, pela Verbo, sob o título "Responsabilidade das Sociedades e dos seus Administradores e Representantes" e do que foi publicado nesse mesmo ano e já com segunda edição de 2018, o "Direito Penal Tributário".

São, de facto, dois os capítulos em que o tema é desdobrado, o primeiro logo directamente orientado ao tema da responsabilidade pessoal dos dirigentes, o segundo ao da responsabilidade das sociedades.

A isso se junta [páginas 69 e seguintes] uma análise de alguns crimes em especial: os crimes ditos "comuns", porquanto previstos no Código Penal [recebimento indevido de vantagem, corrupção no sector público e privado, tráfico de influência, participação económica em negócio e fraude fiscal] e os crimes previstos no Código das Sociedades Comerciais.

A bibliografia final ajuda o leitor a ampliar o estudo.

Direito Premial: não à revolução!


Em declarações públicas proferidas ontem, a ministra da Justiça, Francisca van Dunem, clarificou o sentido político pretendido pelo Governo em matéria de Direito Premial. Citando as suas declarações: «Não tem nada a ver com criar nada de novo ou revolucionário, tem apenas a ver com a identificação de algumas áreas de estrangulamento que precisam de alguma afinação e com a sua intervenção cirúrgica nessas áreas para melhorar a capacidade de resposta do ponto de vista da prevenção e repressão criminal” da criminalidade económico-financeira, explicou Francisca Van Dunem, afastando a ideia de que haverá uma mudança completa de paradigma neste domínio.
Trata-se, pois, por um lado, de uma lógica de alargamento, por estar em causa a criminalidade económico-financeira, por outro, uma lógica restritiva, porquanto se afastam os modelos de ampliação através dos quais alguns sectores pretendiam, à conta do tema, alterações significativas no modelo vigente. 
Facto é que, para além desta asserção geral, nada de específico fica definido como ponto de partida para a revisão do sistema, nem sequer um compromisso com a filosofia da pena negociada que a então PGA defendeu como critério para a Procuradoria Distrital de Lisboa. E assim, creio que qualquer discurso sobre o tema só pode ser consequente em face de propostas concretas que surjam do grupo de trabalho que está criado para o assunto, pois até lá o risco de estarmos ante mera especulação. 
Não pode, porém, esquecer-se, que a Assembleia da República tem poderes legislativos exclusivos na matéria e, assim, não é de excluir que surjam, a partir do hemiciclo, propostas que não se conformem com a via reduzida do pensamento governativo.

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Foto Miguel Lopes/LUSA

Corrupção: um dos cinco pilares


Um dos cinco pilares da estratégia nacional contra a corrupção proposta pela associação Transparência de Integridade [ver a totalidade aqui] está a Justiça [os outros quatro são a política, a administração pública, a sociedade e o sector privado e os reguladores] e quanto a esta são as seguintes as propostas que visam, segundo a proponente «garantir a independência, capacitação e meios legais e materiais do sistema judicial para combater a corrupção, punindo os responsáveis e recuperando os ativos.»

«Propostas e medidas:

1.1 Criar um sistema robusto e eficaz de proteção dos denunciantes, em linha com a Diretiva Europeia recentemente acordada e com as melhores práticas internacionais, de modo a permitir a deteção mais atempada dos crimes e a recolha de denúncias mais fundamentadas e bem documentadas.

1.2 Criar uma agência anticorrupção especializada que reúna competências de investigação, prevenção (no âmbito do setor público e do setor privado), prossecução criminal e educação, como proposto nos arts. 6.º e 36.º da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção. Absorvendo várias das competências atuais do Conselho de Prevenção da Corrupção, da Entidade de Contas e Financiamentos Políticos, do Departamento Central de Investigação e Ação Penal, da Unidade Nacional de Combate à Corrupção e da recém-legislada Entidade para a Transparência, este novo organismo deve ser uma estrutura única de combate à corrupção, com todos os benefícios daí decorrentes, e dotada de meios técnicos e humanos através de garantias de autonomia administrativa e financeira, mediante a fixação do seu orçamento com base numa percentagem fixa do Orçamento de Estado para cada ano.

1.3 Criação de tribunais especializados, com competências específicas em crimes relacionados com corrupção, ao abrigo do art. 211.º da Constituição.

1.4 Reforço da transparência do sistema judicial, através da criação do website da Justiça Portuguesa, que recolha e agregue informações sobre a atividade das várias instituições envolvidas (Ministério Público, Tribunais, etc.) e que contenha, nomeadamente, os seguintes elementos:

a) Estatísticas mais detalhadas e atualizadas sobre o andamento de processos e da Justiça;
b) Disponibilização sistemática e organizada das decisões judiciais (acompanhadas da identificação dos arguidos/réus);
c) Disponibilização sistemática e organizada dos despachos finais de inquérito do Ministério Público;
d) Disponibilização das decisões de processos disciplinares sobre magistrados judiciais.

1.5 Melhoria dos mecanismos de prevenção, através de campanhas de sensibilização a potenciais denunciantes, da criação de gabinetes de intelligence, da análise integrada da informação recolhida sobre processos de corrupção e crimes conexos e do fomento da realização de averiguações preventivas dentro dos trâmites legais.

1.6 Descriminalização da difamação, na medida em que constitui um obstáculo efetivo à denúncia de casos de corrupção.»

Conselho de Ministros de 05.12.2019

O Conselho de Ministros desta quinta-feira, dia 5, aprovou, segundo o comunicado oficial [com menção de relevo para este blog] o seguinte:

-» Plano Nacional de Gestão Integrada dos Fogos Rurais (PNGIFR), que ficará hoje disponível para consulta pública.

Segundo o comunicado «o Plano, que abrange o período 2020-2030, identifica o contexto e designa as orientações e os objetivos estratégicos para uma abordagem integrada ao problema, definindo as responsabilidades das entidades públicas e privadas envolvidas, desde o planeamento até ao pós-evento. Este documento utilizou como base de trabalho os relatórios produzidos pelas duas Comissões Técnicas Independentes, constituídas pela Assembleia da República na sequência dos incêndios de 2017.»


-» Na dependência directa da Ministra da Justiça, um grupo de trabalho para a definição de uma estratégia nacional, global e integrada de combate à corrupção, que compreenda os momentos da prevenção e da repressão, e que envolva a participação de diferentes entidades e profissionais.

De acordo com o comunicado «o grupo de trabalho terá por finalidade desenvolver os objetivos do programa do Governo de, designadamente, instituir um relatório nacional anticorrupção, avaliar a permeabilidade das leis aos riscos de fraude, diminuir as complexidades legais e a carga burocrática, obrigar as entidades administrativas a aderir a um código de conduta ou a adotar códigos de conduta próprios, dotar algumas entidades administrativas de um departamento de controlo interno que assegure a transparência e imparcialidade dos procedimentos e decisões, melhorar os processos de contratação pública, reforçar a transparência das contas dos partidos políticos, e obrigar as médias e grandes empresas a disporem de planos de prevenção de riscos de corrupção e infrações conexas.


-» Proposta de lei que introduz medidas de harmonização e simplificação que visam melhorar o funcionamento do sistema do IVA no comércio intracomunitário, transpondo as Diretivas (UE) n.ºs 2018/1910 e 2019/475.

Procede-se, assim [segundo o comunicado ], «à alteração do Regime do IVA nas Transações Intracomunitárias (RITI), assim como do Código do IVA, no sentido de incluir o município italiano de Campione d'Italia e as águas italianas do lago de Lugano no território aduaneiro da União Europeia.»


O Advogado e o cidadão

Não há apenas a contemporaneidade, também aquilo que o tempo soterrou mas permite reflectir. Isso torna-se imperioso num tempo, como o que vivemos, em que às novas gerações falta consciência histórica e sobretudo vontade de compreenderem que aquilo que hoje está na lei, ou no sentir da jurisprudência, resulta de um sedimentar histórico até se chegar aqui ou, quantas vezes, de tumultuosa luta jurídica por um outro Direito.
Entre o muito que encontrei em alfarrabista, esta pequena separata do Doutor Adelino da Palma Carlos, breve alegação de recurso para a Relação de Lisboa, merece ser revisitada, como excursão a um Direito que foi para que ganhe sentido o Direito que está e a vida como hoje se vive.
Era tempo em que os advogados publicavam as suas peças processuais. O hábito decaiu porque se considerou que era uma forma indevida de publicidade. Olhando para o mundo actual, em que a incessante publicitação ocupa todo o espaço disponível, é irónico.
Era tempo em que as peças processuais eram publicadas com os nomes dos envolvidos e o mesmo sucedia quanto à jurisprudência, pois não se via então gravame à honra das pessoas nem lesão do seu direito à privacidade.
Era tempo em que a alegação era breve [esta tem 29 páginas em oitavo] e não careciam de conclusões.
No caso, a alegação responde a um recurso interposto pelo Ministério Público.
O caso envolvida um funcionário, que fora condenado pelo crime que então se chamava de suborno e estava tipificado no artigo 318º do Código Penal.
Ao tempo, a matéria de facto dada como provada pelo colectivo era definitiva «ainda que não corresponda à prova produzida, como, neste caso, infelizmente aconteceu, na opinião de quantos acompanharam o julgamento», refere o alegante.
O núcleo do argumento da alegação é que a norma incriminadora em causa exigia ao agente «fazer» um acto de suas funções » e no caso aquilo que era imputado ao alegante era, numa parte da condenação, ter-se abstido de fiscalizar [na outra já a conduta era comissiva na forma de inutilizar ou extraviar processos]. 
Para além disso [precisamente em função deste segundo segmento da condenação, a conduta positiva] alegava-se que a mesma estava prevista em outro preceito do Código Penal, o artigo 312º e não o referido artigo 318º sendo «inadmissível que se conceba a existência, no Código de duas normas punindo a mesma infracção».
Lendo o argumentário, não ficam por aqui os motivos de reflexão.
Curioso [face aos parâmetros actuais] é que se pudesse argumentar que «um empregado dos serviços de fiscalização corporativa, no caso da Intendência Geral dos Abastecimentos] não fosse funcionário público e que para fins penais essa distinção [que tinha colhimento no Decreto-Lei n.º 35809, de 16 de Agosto de 1946, por curiosidade ver aqui] relevasse [e assim o considerou o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de Fevereiro de 1948, publicado no Boletim do Ministério da Justiça, ano V, página 165]. Hoje, ante a noção amplíssima de funcionário público para efeitos criminais o argumento cairia por terra.
Igualmente interessante que outro tema da alegação haja sido o colocar em crise que, no caso, se tenha tratado de «acto de suas funções» [assim se referia o artigo incriminador em apreço] com fundamento na ideia que tal implicaria tratar-se de acto da competência legal do funcionário. ~
Em prol desta tese o ilustre professor de Direito mobiliza toda a sua erudição: desde a origem histórica do preceito [o Código Criminal «intentado pela Rainha D. Maria I, de Pascoal de Melo, aos Códigos Penais Francês de 1810 e Brasileiro de 1830 e o comentário do próprio Pascoal de Melo e de Levy Maria Jordão, os tratadistas franceses então em voga Chaveau & Hélie e Garraud, bem como o argumento histórico nacional, desde as Ordenações, das Afonsinas às Filipinas, o Direito Romano expresso na Lex Julia repetundarum, e, enfim, a opinião do alemão von Lizt].
Ciente da necessidade de reforçar a razão que tentava sustentar, Palma Carlos convoca por igual o Dicionário de Cândido de Figueiredo para o qual o «de», enquanto preposição, «exprime restricção da palavra que precede». Assim, o extravio de processos não seria acto «de» função.
No centro do tema, pressente-se, já está, porém, aquilo que viria a ditar a formulação actual da norma sobre corrupção. E, em honestidade intelectual, o alegante reconheco-o: «[...] há hoje quem sustente que na repressão do suborno deve punir-se não só a prática do acto da função, mas também a de todos os actos contrários aos deveres de função; e é possível que a defesa social justifique esta orientação, em face da onda de imoralidade que cobre o mundo».
Ao tempo, o alegante ainda poderia invocar, em lógica política, como o fez já na parte decisiva da sua peça processual: que o artigo 177º do Código Penal Francês era idêntico ao nosso mas quando «em França, como entre nós, a onda de corrupção alastrou, quando as liberdades individuais foram cerceadas e o livre direito de crítica ficou sufocado», então, o Governo de Vichy [de colaboracionismo ao invasor nazi] havia acrescentado em 16 de Março de 1943, ao mencionado artigo do Código Penal uma alínea que passara a abranger o caso de se tratar de acto que «ainda que fora das atribuições pessoais da pessoa corrompida, foi ou teria sido facilitado pela sua função ou pelo serviço que assegurava», modificação que seria mantida por Ordenança de 8 de Fevereiro de 1945, ainda a guerra não havia terminado.
Veja-se a honradez da conclusão. Fiel ao seu papel de advogado [o de defender o acusado de suborno] mas não abdicando da sua condição de cidadão, Adelino da Palma Carlos [professor de Direito, que era  então Bastonário da Ordem dos Advogados e viria a ser o primeiro-ministro da Democracia] escreve: «É mau o sistema? Decerto! Mas a culpa não é dos juízes; nem a deficiência da lei lhes dá o direito de passarem a criar direito, ou a punir, por preceito inaplicáveis que a lei não contempla».

PGR: corrupção e criminalidade conexa

A PGR editou o relatório de síntese intitulado Corrupção e criminalidade conexa relativo aos anos 2014-2017. O texto integral pode ser consultado aqui. Eis alguns excertos.

Inquéritos instaurados

-» Nos anos 2014/2015 (de 01.09.2014 a 31.08.2015), 2015/2016 (de 01.09.2015 a 31.08.2016) e 2016/2017 (de 01.09.2016 a 31.08.2017) foram registados 5564 inquéritos relativos a crimes de corrupção e criminalidade conexa, nesta se compreendendo os crimes de abuso de poder, administração danosa, branqueamento, participação económica em negócio, peculato, recebimento indevido de vantagem e tráfico de influência. 

-» Numa análise comparativa, verifica-se que no período temporal em consideração o número de inquéritos registados por crime de corrupção aumentou 37,7% e o de abuso de poder 33%. Por outro lado, o número de inquéritos registados por crime de peculato, depois de um aumento de 17% no ano 2015/2016, observou um decréscimo de 7,2% no ano 2016/2017. Inversamente, no período 2016/2017 o número de inquéritos registados por crime de branqueamento de capitais sofreu um aumento de 15,8% relativamente ao ano 2014/2015, após uma inexpressiva diminuição no ano 2015/2016.

Inquéritos findos

-» No período temporal em consideração findaram 3337 inquéritos, dos quais 457 por acusação, 2734 por arquivamento e foi aplicado o instituto da suspensão provisória do processo em 146 inquéritos. O que significa que em 18,1% dos inquéritos encerrados foi exercida a ação penal pelo Ministério Público (457 acusações + 146 suspensões provisórias).

Decisões finais/condenações/por tipo de crime/2015-2016

-» Abuso de poder: prosseguiram 12 acusações. Foi proferida decisão transitada em 7 processos. 2 processos terminaram com condenação de 2 arguidos em pena de prisão suspensa na sua execução. 5 processos, envolvendo 10 arguidos, terminaram com absolvição. 2 processos, envolvendo 6 arguidos, encontram-se na fase de julgamento. 3 processos, envolvendo 5 arguidos, encontram-se na fase de recurso para tribunal superior. Nos processos findos, a taxa de condenação processual situou-se nos 28,6% e a taxa de condenação individual nos 16,7%.

-» Administração danosa: prosseguiu 1 acusação, contra 2 arguidos, encontrando-se o processo na fase de julgamento.

-» Branqueamento de capitais: prosseguiram 10 acusações. Foi proferida decisão transitada em 3 processos. 2 processos terminaram com condenação de 2 arguidos em pena de prisão suspensa na sua execução e a absolvição de 1 arguido. 1 processo, envolvendo 1 arguido, terminou com absolvição. 4 processos, envolvendo 36 arguidos, encontram-se na fase de julgamento. 3 processos, envolvendo 34 arguidos, encontram-se na fase de recurso para tribunal superior. Nos processos findos, a taxa de condenação processual situou-se nos 66,7% e a taxa de condenação individual nos 50%.

-» Corrupção: prosseguiram 22 acusações. Foi proferida decisão transitada em 13 processos. 7 processos, envolvendo 9 arguidos, terminaram com condenação de:  6 arguidos em pena de prisão suspensa na execução;  2 arguidos em pena de prisão substituída por prestação de trabalho a favor da comunidade;  1 arguido em pena de multa. Foi aplicado o instituto da suspensão provisória do processo na fase da instrução em 1 processo, envolvendo 1 arguido. 5 processos, envolvendo 16 arguidos, terminaram com absolvição. 7 processos, envolvendo 78 arguidos, encontram-se na fase de julgamento. 33 2 processos, envolvendo 5 arguidos, encontram-se na fase de recurso para tribunal superior. Nos processos findos, a taxa de condenação processual situou-se nos 61,5% e a taxa de condenação individual nos 38,5%.

-» Participação económica em negócio: prosseguiram 3 acusações. 1 processo, envolvendo 1 arguido, terminou com absolvição. Num processo, envolvendo 1 arguido, foi proferido despacho de não pronúncia na fase de instrução. 1 processo, envolvendo 3 arguidos, encontra-se na fase de recurso para tribunal superior.

-» Peculato: prosseguiram 76 acusações. Foi proferida decisão transitada em 51 processos. 37 processos, envolvendo 44 arguidos, terminaram com condenação de:  37 arguidos em pena de prisão suspensa na execução;  1 arguido em pena de prisão substituída por prestação de trabalho a favor da comunidade;  2 arguidos em pena de prisão substituída por multa;  1 arguido em pena de multa. Em processos em que existiu condenação foi ainda proferida absolvição relativamente a 3 arguidos. 12 processos, envolvendo 13 arguidos, terminaram com absolvição. Em 2 processos, envolvendo 3 arguidos, foi proferido despacho de não pronúncia na fase de instrução. 18 processos, envolvendo 36 arguidos, encontram-se na fase de julgamento. 7 processos, envolvendo 9 arguidos, encontram-se na fase de recurso para tribunal superior. Nos processos findos, a taxa de condenação processual situou-se nos 72,6% e a taxa de condenação individual nos 68,3%.

-» Recebimento indevido de vantagem: prosseguiram 3 acusações 3 Foi proferida decisão transitada em 2 processos, envolvendo 5 arguidos, os quais terminaram com condenação de:  1 arguido em pena de prisão suspensa na execução;  2 arguidos em pena de multa;  2 arguidos em pena de prisão substituída por proibição de exercício da profissão. 1 processo, envolvendo 3 arguidos, encontra-se na fase de julgamento.

Denúncias on line

-» No ano de 2014, foram recebidas 1941 denúncias através da aplicação “Corrupção- Denuncie aqui”, existente no Portal do Ministério Público. No mesmo período temporal, foram analisadas 1943 denúncias recebidas através da referida aplicação , as quais deram lugar à instauração de 19 inquéritos e 20 averiguações preventivas, à remessa de 597 denúncias a outras entidades e ao arquivamento de 1307 denúncias.

-» No ano de 2015, foram recebidas 1476 denúncias através da referida aplicação. No mesmo período temporal, foram analisadas 1484 denúncias ali recebidas , as quais deram lugar à instauração de 110 inquéritos e 28 averiguações preventivas, à remessa de 505 denúncias a outras entidades e ao arquivamento de 841 denúncias.

-» No ano de 2016, foram recebidas e analisadas 1482 denúncias através da mesma aplicação, as quais deram lugar à instauração de 210 inquéritos e 32 averiguações preventivas, à remessa de 434 denúncias a outras entidades e ao arquivamento de 806 denúncias. 

-» No ano de 2017, até ao dia 31 de outubro, foram recebidas e analisadas 1510 denúncias através da mesma aplicação, as quais deram lugar à instauração de 139 inquéritos e 10 averiguações preventivas, à remessa de 400 denúncias a outras entidades e ao arquivamento de 701 denúncias.

Comunicações por prevenção de branqueamento de capitais

-» Ano de 2014 – foram recebidas 2903 comunicações e, subsequentemente, instaurados 60 inquéritos. Foi ainda determinada a suspensão de 43 operações bancárias, em que estavam em causa a movimentação de 34,3 milhões de euros e 2,2 milhões de dólares americanos.

-» Ano de 2015 – foram recebidas 3865 comunicações e, subsequentemente, instaurados 63 inquéritos. Foi ainda determinada a suspensão de 64 operações bancárias, em que estavam em causa a movimentação de 47,1 milhões de euros e 9,5 milhões de dólares americanos.

-» Ano de 2016 – foram recebidas 5186 comunicações e instaurados 41 inquéritos. Foi determinada a suspensão de 41 operações bancárias, abrangendo a movimentação de 25,5 milhões de euros e 2,7 milhões de dólares americanos.

-» Ano de 2017 (até 31.10) – foram recebidas 5018 comunicações e instaurados 42 inquéritos. Foi determinada a suspensão de 42 operações bancárias, abrangendo a movimentação de 9,2 milhões de euros e 2,6 milhões de dólares americanos.

Notícias ao Domingo!


-» Fiscal/troca  automática de informações/instituições financeiras: o Decreto-Lei n.º 64/2016 - Diário da República n.º 195/2016, Série I de 2016-10-1175504446 , no uso da autorização legislativa concedida pelos n.os 1, 2 e 3 do artigo 188.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março, regula a troca automática de informações obrigatória no domínio da fiscalidade e prevê regras de comunicação e de diligência pelas instituições financeiras relativamente a contas financeiras, transpondo a Diretiva n.º 2014/107/UE, do Conselho, de 9 de Dezembro de 2014, que altera a Diretiva n.º 2011/16/UE

-» Contra-ordenações/Ana de Oliveira Monteiro: formulando um juízo crítico sobre o regime jurídico contraordenacional [ver aqui], a autora, Advogada, filiada no Forum Penal, aponta na revista on line Advogar facetas do sistema que o tornam, mau grado ser Direito Sancionatório.

Cito este trecho elucidativo: «Mas se o “Regime Geral das Contraordenações” se vem revelando incapaz de assegurar o direito a um processo equitativo e o respeito pelas mais elementares garantias de defesa – veja-se, a título meramente exemplificativo, que aqui vigora o princípio da irrecorribilidade das decisões, que as sentenças judiciais são sempre insuscetíveis de recurso da matéria de facto e que o prazo de interposição de recurso da sentença é de dez dias seguidos – surpreendentemente, os regimes avulsos mostram-se sempre mais penalizadores e ainda menos garantísticos!»

-» Acórdão do TRC/acusação manifestamente infundada: o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 09.11.2016 [relatora Isabel Valongo, texto integral aqui] decidiu que: «A acusação é manifestamente infundada quando, de todo, os factos que a integram não constituem crime, e não também nas situações cujos factos, na mesma descritos, são, no referido plano da verificação de um ilícito penal, juridicamente controversos.»

Fundamentando o seu raciocínio o aresto considerou: «está vedado ao Juiz do Julgamento ultrapassar o objecto que lhe é submetido por via da acusação formulada, sendo certo que a qualificação jurídica também faz parte integrante de tal objecto, ou seja, o juiz não pode, no despacho a que se refere o art. 311º do Cód. Proc. Penal, alterar sem mais, a qualificação jurídica dos factos - cfr, entre outros o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 28/09/2000, in CJ ANO XXV, Tomo IV, pág. 140, Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 05/01/2000, CJ, ano XXV, tomo 1, pág 43 e ainda Ac. do Tribunal da Relação do Porto, de 14/12/2005. No processo de estrutura acusatória, as funções de acusador e de julgador são exercidas por órgãos diferenciados e autónomos, e o julgador, nos quadros da dialéctica processual decorrente do princípio do acusatório, estará sempre confinado ao solucionamento da questão penal tal como ela lhe é proposta pelo Ministério Público ou pela parte acusadora privada. Qualificar um determinado facto do ponto de vista jurídico-penal é subsumir um determinado acontecimento na descrição abstracta de uma preposição penal, i. e, verificar se aquele comportamento concreto daquele agente, corresponde ou não, ao comportamento abstractamente descrito numa dada lei penal como constituindo um crime. Só desta forma se opera a qualificação jurídico-penal. Contudo, na fase de saneamento do processo, excluída - pela redacção que a Lei nº 65/98 de 25/8 deu ao preceito em referência e que fez caducar o Acórdão de Fixação de Jurisprudência nº 4/93, - a possibilidade de rejeição da acusação por manifesta insuficiência de prova indiciária, este fundamento só pode ser aferido diante do texto da acusação, quando faltem os elementos típicos objectivos e subjectivos de qualquer ilícito criminal da lei penal Portuguesa, seja devido a uma insuficiente descrição fáctica, seja porque a conduta imputada ao agente não tem relevância penal. Obviamente, exige-se que os factos descritos sejam insusceptíveis de integrar qualquer ilícito penalmente tipificado. O objecto do processo é o crime tal como está definido na alínea a), do nº 1, do artigo 1º, do CPP. Liminarmente se afasta a possibilidade de, perante várias soluções direito, formular um juízo sustentado numa opinião diversa da do MP, não se cuidando neste momento do seu mérito. Vedada está pois a rejeição da acusação por inexistência de crime que se fundamente numa das várias correntes seguidas pela jurisprudência, que perante o quadro fáctico descrito, se mostre controvertida.»

-» Acórdão do TRC/escusa de juiz/alteração substancial de factos: o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 09.11.2016 [relatora Maria José Nogueira, texto integral aqui] decidiu que: «I - A comunicação da alteração substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, nos termos do disposto no artigo 359.º do CPP não conduz, por si, a um juízo de quebra de imparcialidade e/ou isenção do julgador capaz de o afastar de um futuro julgamento decorrência dos novos factos. II - Com efeito, não faria sentido que, uma vez obtido o acordo previsto no n.º 3 do artigo 359.º do CPP, o legislador mandasse prosseguir o julgamento pelo mesmo tribunal, não reconhecendo, assim, quebra aos enunciados princípios e, pelo contrário, dando os novos factos - que conduziram à comunicação de uma alteração substancial - origem a um novo processo se encarasse aquele (tribunal/julgador) como diminuído na sua isenção e/ou imparcialidade. III - Porém, se, como no caso concreto, o julgador antecipa o juízo de condenação - embora não lhe fosse possível continuar o julgamento pelos novos factos e qualificação jurídica, não limitou a sua atividade (em sede de decisão de facto) aos factos constantes da acusação, considerando estes (e só estes) como provados ou não provados, antes expandiu a análise aos factos, previamente comunicados a título de alteração substancial, pelos quais o julgamento não pôde prosseguir, e definiu o seu enquadramento jurídico -, impõe-se reconhecer sair comprometida a dimensão objetiva da imparcialidade, justificando-se, por conseguinte, o deferimento do pedido de escusa.»

Da fundamentação do aresto respigamos o seguinte: «Naturalmente que o legislador não se pronuncia sobre o que pode integrar o motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a imparcialidade do juiz, tarefa, a nosso ver, impensável, pela dificuldade em concretizar todas as circunstâncias idóneas a tal. Será, pois, casuisticamente com recurso aos parâmetros, genericamente, delineados que se há-de decidir. A propósito, escreveu Germano Marques da Silva Ao contrário do que sucede com os impedimentos e sucedia também no CPP de 1929, o CPP não enumera as causas geradoras de suspeição: utiliza uma fórmula ampla, abrangente de todos os motivos que sejam adequados a gerar desconfiança sobre a imparcialidade do juiz (art. 43.º, n.º 1). Os motivos que podem gerar desconfiança sobre a imparcialidade do juiz podem ser da mais diversa natureza. O CPP/29 reduzia-os todos a relações de parentesco, de interesse ou de inimizade que ligassem o juiz ou seus parentes ao assistente, ao ofendido ou ao arguido (…). CPP/87 utilizou técnica diferente da do CPP/29, mas as relações que neste constituem motivo de suspeição continuam naturalmente a ser motivos, sérios e graves, adequados a gerar desconfiança sobre a imparcialidade do juiz – [cf. Curso de Processo Penal, I, Editorial Verbo, 1994, pág. 198/199]. Por seu turno, ensina Figueiredo Dias, in DPP, 1.0, 320 “pertence”, a cada juiz evitar, a todo o preço, quaisquer circunstâncias que possam perturbar aquela atmosfera, não enquanto tais circunstâncias possam fazê-lo perder a imparcialidade, mas logo enquanto possa criar nos outros a convicção de que ele a perdeu. Sobre o que denomina por teste subjetivo e objetivo da imparcialidade, refere Pinto de Albuquerque O teste subjetivo da imparcialidade visa apurar se o juiz deu mostras de um interesse pessoal no destino da causa ou de um preconceito sobre o mérito da causa. Ao aplicar o teste subjetivo a imparcialidade do juiz deve ser presumida e só factos objetivos evidentes devem afastar essa presunção … O teste objetivo da imparcialidade visa determinar se o comportamento do juiz, apreciado do ponto de vista do cidadão comum, pode suscitar dúvidas fundadas sobre a sua imparcialidade (…) – [cf. Comentário do Código de Processo Penal, 2.ª Edição, Universidade Católica Portuguesa, pág. 127/128]. Ainda a tal respeito afirma Cavaleiro de Ferreira que importa considerar sobretudo que, em relação ao processo, o juiz possa ser reputado imparcial, em razão dos fundamentos da suspeição verificados, sendo este também o ponto de vista que o próprio juiz deve adotar, para voluntariamente declarar a sua suspeição. “Não se trata de confessar uma fraqueza; a impossibilidade de vencer ou recalcar questões pessoais, ou de fazer justiça, contra eventuais interesses próprios, mas de admitir ou não admitir o risco de não reconhecimento público da sua imparcialidade pelos motivos que constituem fundamento da suspeição (…) – [cf. Curso de Processo Penal, I, pág. 237/239]. Também o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem tem entendido que a imparcialidade se presume até prova em contrário; e que, sendo assim, a imparcialidade objetiva releva essencialmente de considerações formais e o elevado grau de generalização e abstração na formulação do conceito apenas pode ser testado numa base rigorosamente casuística, na análise in concreto das funções e dos atos processuais do juiz. Foi, pois, para obviar a efeitos perversos, e como tal intoleráveis, do princípio do juiz natural, inscrito na Constituição, que o legislador lançou mão dos impedimentos, suspeições, recusas e escusas, acautelando, deste modo, a imparcialidade e isenção do juiz, igualmente com proteção constitucional, garantidas como pressuposto subjetivo necessário a uma decisão justa, mas também como pressuposto objetivo da sua perceção externa pela comunidade (…) – [cf. Manuel Simas Santos e Leal – Henriques, Código de Processo Penal Anotado, Vol. I, 3.ª edição, pág. 304].»

-» Projecto Ethos/PGR/conferência internacional sobre a corrupção: pode consultar-se aqui a notícia e o programa da conferência que terá lugar em Lisboa, na Fundação Calouste Gulbenkian. A inscrição é obrigatória.

-» Diplomas promulgados pelo Presidente da República a 17.11.2016: segundo o site da Presidência da República o Presidente promulgou os seguintes diplomas legais:

* oriundos da Assembleia da República: diploma que procede à alteração ao Código Penal transpondo a Diretiva n.º 2014/62/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, relativa à proteção penal do euro e de outras moedas contra a contrafação e que substitui a Decisão-Quadro 2000/383/JAI do Conselho; diploma que procede à primeira alteração, por apreciação parlamentar, ao Decreto-Lei n.º 41/2016, de 1 de agosto, que altera o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, o Regime do IVA nas Transações Intracomunitárias, o Decreto-Lei n.º 185/86, de 14 de julho, o Código do Imposto do Selo, o Código do Imposto Municipal sobre Imóveis e o Código do Imposto Único de Circulação.

* oriundos do Governo: diploma que cria a Unidade Nacional de Combate ao Cibercrime e à Criminalidade Tecnológica; diploma que estabelece os limites máximos das perdas por imparidade e outras correções de valor para risco específico de crédito dedutíveis para efeitos do apuramento do lucro tributável em IRC, bem como as regras a observar na sua determinação, nos termos do n.º 2 do artigo 28.º-A e no n.º 1 do artigo 28.º-C do CIRC, a aplicar no período de tributação que se inicie em ou após 1 de janeiro de 2016

-» Mota Pinto/biografia: o acto de apresentação da biografia do Professor da Faculdade de Direito de Coimbra, Professor Mota Pinto, presidido pelo Chefe do Estado, pode ser visto aqui.

-» Leituras/Fernanda Palma/Direito Penal: acaba de ser editado pela Associação Académica da
Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa. Corresponde às lições ministradas e refere-se ao primeiro volume do que foi publicado entre 2013 e 2915.
A essência do livro abarca a fundamentação e a legitimação bem como a interpretação do Direito Penal.
Segue o paradigma usual neste tipo de exposição, abarcando numa primeira parte o problema do fim das penas - com particular ênfase para a questão do artigo 40º do Código Penal - e na segunda a matéria da interpretação e aplicação no tempo das normas criminais.

Notícias ao Domingo!


-» Conselho Superior da Magistratura/Regulamento: foi publicado o Regulamento do Conselho Superior da Magistratura, revogando o que estava em vigor desde 1993. O texto pode ser lido aqui.

-» Blawgs/Vexata Quaestio: entre os blogs  jurídicos que surgiram [e a designação blawgs quadra bem à sua designação] e tantos foram, os que se finaram, e isso a imensos sucedeu, o Vexata Quaestio [ver aqui] mantém-se. Blog jurídico, de facto, presta um importante serviço público. Celebrou onze anos esta semana que agora finda. Muitos parabéns e longa vida!

-» Acórdão do TConst/defesa em fase de reenvio: o Acórdão do TC de 3 de Novembro de 2916 [relator João Pedro Caupers, texto integral aqui] estatuiu que não são julgadas inconstitucionais as normas conjugadas dos artigos 315.º e 426.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, interpretadas no sentido de não ser de conceder prazo de defesa ao arguido, para apresentação de contestação e rol de testemunhas, no âmbito da decisão de reenvio para novo julgamento por tribunal superior. Com efeito, o objeto do processo fixa-se em momento processual anterior ao da audiência de julgamento, com a dedução da acusação e/ou decisão de pronúncia, sendo evidente que a anulação do julgamento não importa qualquer modificação do objeto do processo, que se mantém essencialmente uno e idêntico em todas as fases do processo penal e sendo exatamente igual a matéria sobre a qual o arguido teve a possibilidade de se pronunciar e produzir prova e aquela sobre que recairá, por força da decisão de reenvio, o novo julgamento. Nestes termos, mantendo-se a instância estável, não pode o arguido, a pretexto da decisão anulatória do tribunal superior, pretender fazer o que não fez em tempo oportuno, contestar e arrolar testemunhas.

Sustentando a sua fundamentação, considerou o TC que: «impondo a Constituição que a causa penal seja objeto de apreciação e decisão judiciais no «mais curto prazo» (artigo 32.º, n.º 2), e não apenas «em prazo razoável», como exige para os demais processos judiciais (artigo 20.º, n.º 4) - sendo à luz desta particular exigência, e dos valores que a justificam, que se deve entender a estruturação faseada e progressiva do processo penal -, não se vê como sustentar, no plano constitucional, a reivindicação, por parte do recorrente, de um novo prazo de defesa, para apresentação de contestação e rol de testemunhas, quando já lhe foi reconhecido, no processo, o direito processual de contestar os factos imputados na acusação e carrear prova que demonstre a sua inocência, e há muito que decorreu o prazo legal previsto para o efeito.»

-» AC/efeito dos recursos: segundo se informa no site respectivo [ver aqui]: «O Tribunal da Relação de Lisboa decidiu, em acórdãos de 11 de outubro e 27 de outubro de 2016, que os recursos de decisão interlocutória da AdC não têm efeito suspensivo, mas sim efeito meramente devolutivo. A AdC vê agora confirmado o seu entendimento de que, sem prejuízo da normal sindicância de quaisquer atos da AdC, a Lei da Concorrência prevê expressamente que a investigação de uma determinada infração não fica prejudicada pela litigância que possa existir durante o procedimento, sob pena de paralisação das investigações em curso.»

OA/Estatuto em e-book: a Ordem dos Advogados Portugueses acaba de publicar o seu Estatuto em formato ebook. Pode aceder-se a ela aqui.

-» Leituras/Media, Corrupção Política e Justiça: coordenado por Inês Ferin Cunha e Estrela . São estudos sobre a relação entre os media e a justiça nomeadamente na cobertura por aqueles de processos relativos a processos de corrupção efectivados pelo Centro de Investigação Media e Jornalismo.
Análise casuística em grande parte dos trabalhos, a partir de determinados processos denominados "mediáticos" (António João Maia, Patrícia Contreiras e Èrica Anita Baptista, Brun Bernardo de Araújo e Helder Rocha Priro, Mafalda Lobo, Lorela Broucher), só algumas das análises se propõem uma avaliação global da questão (Estrela Serrano, do Centro de Investigação Media e Jornalismo e Bruno Paixão, da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra). 
O universo em análise cobre o período de 2005/2012. 
Alguns dos trabalhos focam a problemática do segredo de justiça e da natureza diversa da investigação jornalística e da investigação criminal, bem como a problemática da admissão dos jornalistas como assistentes em processo penal.
A obra foi editada este ano pela "Mariposa Azul".

Notícias ao Domingo!



DCIAP/Branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo/delegação de poderes: dada a maior afluência de processos referentes a estas matérias, regulados pela Lei 25/2008, de 5 de Junho [ver aqui], o Despacho n.º 11076/2016 [ver aqui] procedeu à delegação, por parte do Director do DCIAP de poderes inerentes a actuação no domínio do combate ao branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo em mais procuradores daquele Departamento, «designadamente» [e o advérbio suscita-me dúvidas de legalidade por indeterminação pois que a delegação exige-se seja expressa] os Procuradores da República Dr. Jorge Humberto Gil Moreira do Rosário Teixeira, Dr. Carlos Alberto Casimiro Nunes, Dr.ª Inês Catalão Sena Henriques Bonina, Dr.ª Carla Susana Teixeira Figueiredo, Dr. Rui Pedro Correia Ramos Marques, Dr.ª Ana Cristina Nunes Catalão, Dr.ª Isabel Maria Lopes Nascimento, Dr.ª Ana Cláudia Perfeito de Oliveira Porto, Dr. Ricardo Jorge Bragança de Matos, Dr.ª Sílvia Maria Frias Gaspar, Dr.ª Tahamara Amina Thurn -Valsassina dos Santos Dias, Dr.ª Paula Cristina Silva Nunes de Moura, Dr.ª Ana Cristina Lopes Pereira, Dr. João Paulo Anastácio Centeno, bem como os Procuradores adjuntos Dr. Filipe Carlos Marta Pereira da Costa, Dr.ª Marta Patrícia de Correia C. Viegas e Dr.ª Rita Cláudia Costa Simões. 

Banco de Portugal/Boletim Oficial: foi publicado o Boletim Oficial n.º 9/2016, de 15 de Setembro no qual constam as Instruções 11/2016 [comunicação de riscos de incumprimento] e 13/2016 sobre Normas de Contabilidade Ajustadas. Ver aqui.

Brasil/Corrupção/projecto de lei António Thame: está em discussão o projecto de lei cujo texto pode ser lido aqui; o iter parlamentar está aqui; a posição do Bastonário da Ordem dos Advogados do Brasil consta aqui;

EUA/CFTC/Pagamento a denuncianates: já não apenas a SEC americana, como noticiei anteriormente aqui, a ter um programa específico para pagamento aos denunciantes. Também a Commodity Futures Trading Commission (CFTC), entidade incumbida da regulação dos mercados, cujo site pode ser visto aqui tem um programa idêntico que pode ser consultado aqui, cujas regras estão aqui.


Cego, Advogado da Google tive um colega de curso a quem a cegueira não impedia de ter dos livros uma exacta percepção, dos códigos uma noção da sistemática. Estudei com ele e vi a entender definitivamente o que é o essencial do pensamento jurídico, a capacidade de arrumação dos conceitos, no caso a juntar a uma notável memorização. Lembrei isso ao ler esta notícia aqui.


Leitura/Branqueamento de capitais/:The Panama Papers: after the dust has settled  publicado em Agosto de 2016, pelo Vortex Centrum Limited [aqui], parte da companhia Anti Money Laundering Network. O livro contém duas partes.

(i) «The Panama Papers: after the dust has settled; The general media has focussed on the alleged criminality and even the morality of some of the thousands of clients of a large law firm. However, there is another aspect to the case that should worry financial crime risk officers: it's one we, at The Anti Money Laundering Network, our Group, have been warning about since the mid 1990s - and others have consistently told us we were wrong. Mossack Fonseca's defence of its dealings with some high profile persons and entities proves that we were right all along and the big law firms and accountancy / consultancy practices in addition to professional membership groups and even regulators were the ones who had it wrong. 

«(ii) US and others face dilemma over Malaysia's 1MDB money: "Over the course of an approximately four-year period, between approximately 2009 and at least 2013, multiple individuals, including public officials and their associates, conspired to fraudulently divert [thousands of millions] of dollars from 1MDB through various means." - USA Justice Department Court Documents. » [da apresentação; pode ser adquirido aqui]



Notícias ao Domingo!



OCDE/Corrupção/pessoas colectivas: os países que integram a OCDE estão abrangidos por uma Convenção visando o combate à corrupção, complementada por diversos outros instrumentos jurídicos [ver aqui]. No âmbito das actividades daquele organismos está a ser conduzido um inquérito [ver aqui], baseado num relatório [ver aqui] quanto à aplicabilidade de mecanismos jurídicos específicos visando a responsabilização das pessoas legais (ditas também morais nos países francófonos ou colectivas segundo o nosso Direito).

Portugal/branqueamento de capitais: a CMVM mantém uma lista actualizada da legislação aqui

Brasil/violência doméstica/alteração à Lei Maria da Penha: A Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) define que a renúncia à representação só pode ser feita durante audiência específica e na presença do juiz. O projeto do Senador Eduardo Lopes [ver aqui] prevê que seja marcada nova audiência, 60 dias após a primeira, para que a vítima possa confirmar seu posicionamento.

ReverLaw: baseado no conceito do jogo Pokemon foi lançado pela Universidade de Wetsminster um programa de ensino para juristas criminalistas visando, através da imersão na realidade virtual, fazê-los encontrar os meios de prova para um caso de homicídio. Para os incrédulos ver aqui a notícia e aqui o site oficial.

PGDL/legislação anotada: «dando continuidade e alargando o âmbito do trabalho que tem sido desenvolvido, relativo à publicação de legislação e jurisprudência, a PGDL, vai a partir de agora, proceder, à anotação, com jurisprudência, pareceres e doutrina, não só dos diplomas legais da área penal, mas também de outros diplomas, começando pelos da área laboral», informa o magnífico site da Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa [ver aqui]

Revista Julgar/ASJP/CEJ/análise à alteração às leis penais/conferência/28.09: realiza-se no CEJ. Ver o programa aqui

Metáfora e ironia no Direito: visto ângulo de uma tese de doutoramento. Autor: Pedro Parini Marques da Silva. A ler aqui.

Leitura/Espanha/Branqueamento culposo de capitais: da autoria de Calderón Tello, e Lyonel Fernando, trata-se uma extensa monografia sobre a criminalização do branqueamento culposo de capitais. [pode ser adquirido aqui]

«PARTE I. Elementos para configurar el delito de blanqueo de capitales culposo o por imprudencia grave Capítulo I. El delito culposo o imprudente Capítulo II. El delito de blanqueo de capitales imprudente 

PARTE II. Delimitación del ámbito de aplicación entre los delitos de blanqueo de capitales y receptación Capítulo III. Protección de bienes jurídicos o de la vigencia de la norma: consecuencias dogmático-prácticas de la discusión material respecto del blanqueo de capitales y de la receptación Capítulo IV. Bien jurídico protegido por los delitos de blanqueo de capitales: ¿Protegen el blanqueo y la receptación distintos bienes jurídicos? Capítulo V. Objeto material en los delitos de blanqueo de capitales: hacia una necesaria delimitación del ámbito de aplicación entre el delito de blanqueo de capitales y el delito de receptación» [da informação editorial]

Cooperação criminal de empresas: o caso norte-americano



Os princípios básicos para o Foreign Corrupt Practices Act (1977), emendado (15 U.S.C. §§ 78dd-1, et seq.) foram estabelecidos há um ano, nos EUA, no memorando Yates [ver aqui].As regras orientadoras da cooperação para benefício por parte das empresas visadas pelas investigações sumaria-se nesta frase do mesmo:

«In order for a company to receive any consideration for cooperation under the Principles of Federal Prosecution of Business Organizations, the company must completely disclose to the Department all relevant facts about individual misconduct. Companies cannot pick and choose what facts to disclose. That is, to be eligible for any credit for cooperation, the company must identify all individuals involved in or responsible for the misconduct at issue, regardless of their position, status or seniority, and provide to the Department all facts relating to that misconduct. If a company seeking cooperation credit declines to learn of such facts or to provide the Department with complete factual information about individual wrongdoers, its cooperation will not be considered a mitigating factor pursuant to USAM 9-28.700 el seq. 2 Once a company meets the threshold requirement of providing all relevant facts with respect to individuals, it will be eligible for consideration for cooperation credit. The extent of that cooperation credit will depend on all the various factors that have traditionally applied in making this assessment (e.g., the timeliness of the cooperation, the diligence, thoroughness, and speed of the internal investigation, the proactive nature of the cooperation, etc.).»


Em resultado da actividade do organismo foram decretadas penas de prisão já significativamenet severas e que um estudo académico elencou aqui

1. Joel Esquenazi: 180 months (2011)

2. William Jefferson: 156 months (2009)

3. Charles Paul Edward Jumet: 87 months (2010)

4. Carlos Rodriguez: 84 months (2011)

4. Herbert Steindler: 84 months (1994)

5. Douglas Murphy: 63 months (2005)

6. Shu Quan-Sheng: 51 months (2009)

7. Benito Chinea: 48 months (2015)

7. Joseph Demeneses: 48 months (2015)

8. Jorge Granados: 46 months (2011)

9. David Kay: 37 months (2005)

9. John Webster Warwick: 37 months (2010)

10. Jose Alejandro Hurtado: 36 months (2015)

10. Faheem Mousa Salam: 36 months (2007)

Corrupção e crimes conexos: uma análise sociológica


Interessante, documentada, discutível que seja. Trata-se da tese de mestrado intitulada A Corrupção Participada na Administração Local em Portugal (2004-2008), da autoria de Inês Glória Simões Lima, apresentada em 2011 no ICS da Universidade de Lisboa. Pode ser lida aqui.

Cito o resumo:

«Um estudo recente sobre a corrupção participada e criminalidade conexa em Portugal mostrou, no que toca aos Ministérios e Serviços com maior número de arguidos, que a Administração Local é o principal foco de corrupção participada entre os anos 2004-2008. Construído através dos dados do Projecto “O Estudo da Corrupção em Portugal: A realidade judiciária – Um enfoque sociológico”, baseado numa amostra composta pelos processos instaurados entre o ano de 2004 e 2008 por crime de corrupção e infracções conexas (N=345) e numa amostra dos arguidos constituídos no âmbito desses mesmos processos-crime (N=352), o presente estudo centra-se na análise da interdependência entre os múltiplos indicadores de caracterização sociológica dos agentes corruptos e dos processos-crime instaurados e pretende averiguar que configurações são definidas no contexto da governação local. Este trabalho procura ainda reflectir acerca das causas que condicionam a ocorrência e persistência da corrupção na Administração local e as suas implicações no capital social e na qualidade e desempenho da governação local democrática.»

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Fonte da foto aqui

Contratação pública

Quando se propala que que se quer mais transparência e mais igualdade de oportunidades na contratação pública, a legislação europeia vem em sentido inverso. Pelo menos é o que se entende desta constatação: «Curiosamente, a 1 de Janeiro de 2010, ou seja exactamente dois anos antes, entrou em vigor o Regulamento n.º 1177/2009, que alterou também as Directivas 2004/17/CE, 2004/18/CE do Parlamento e do Conselho, fixando contrariamente ao que agora se verifica, limiares mais baixos para o valor dos contratos que podem ser celebrados na sequência de procedimentos de concurso público e concurso limitado por prévia qualificação, sem publicidade internacional». Fê-la a Advogada Leonor Guedes Oliveira, aqui, no Advocatus. Uma porta aberta ao favoritismo e à corrupção.

Das “vítimas” no crime de corrupção: a lógica do “qualquer um”

Eis o texto integral do que afirmei em Faro em 16.11.11, nas Jornadas organizadas pelo DCIAP sobre o combate à corrupção. O texto ainda merecerá algum trabalho de revisão, mas fica desde já como um primeiro contributo público para a reflexão.

Solicitam-me que aborde o tema dos direitos das vítimas no crime de corrupção. O tema é interessante, porque gerador de inúmeras contradições e, como tal, provocante.
Sendo tradicionalmente o bem jurídico que se considera protegido com tal incriminação de natureza estadual [ou no mínimo de matriz eminentemente pública] parece não haver lugar para a individualização de ofendidos e, por isso, parecerá esdrúxula a questão de saber qual o papel das vítimas no crime de corrupção.
E eu, no entanto, pois que convidado a falar neste assunto, privado estaria, afinal, de tema, e o auditório, consequentemente descansado estava, por ser esta uma das palestras mais rápidas do mundo.
Vejamos, por etapas se isso é, de facto, assim, iniciando viagem: haverá isso que dá título a esta intervenção, “vítimas” no crime de corrupção?
Primeira etapa. Efectivamente, não é preciso uma longa excursão pelos que se têm interessado por este ilícito para concluir que, historicamente, no crime de corrupção relevam primacialmente interesses e valores de cunho estritamente estadual ou público.
Seja a «pureza da função pública», a «falsificação ou adulteração da vontade do Estado», a «confiança ou credibilidade do Estado perante a colectividade», a sua «eficácia ou capacidade de intervenção para a realização das finalidades que lhe estão atribuídas», a «autonomia intencional do Estado»[1] , com as concomitantes exigências de «legalidade, objectividade e independência», sempre estaremos perante valores e interesses nos quais nada aflora que tenha natureza civil.
E, por isso, e segundo esta visão das coisas, o que há para ser defendido pela criminalização restringir-se-ia ao intramuros do Estado, nada havendo que merecesse defesa no que ao território da cidadania respeita.
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[1] O enunciado consta da anotação de A. M. Almeida Costa, Comentário Conimbricense ao Código Penal, Tomo III. Acabou por vingar a ideia segundo a qual a corrupção (própria, isto é, para acto ilícito, e imprópria, a que visa os actos lícitos) traduz-se, por isso, numa manipulação do aparelho do Estado pelo funcionário que, assim, viola a autonomia intencional do último, ou seja, em sentido material, infringe as exigências de legalidade, objectividade e independência que, num Estado de direito, sempre têm de presidir ao desempenho das funções públicas”. E o mesmo, afinal, para todas as espécies deste crime.
Confrontar a propósito o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03.10.02 [publicado na Colectânea de Jurisprudência/STJ, III, 2002, págs. 185 e seguintes], segundo o qual «o bem jurídico da corrupção consiste na autonomia intencional do Estado, posto que, "ao transaccionar com o cargo o empregado público corrupto coloca os poderes funcionais ao serviço dos seus interesses privados, o que equivale a dizer que, abusando da posição que ocupa, se "subroga" ou "substitui" ao Estado, invadindo a respectiva esfera de actividade. A corrupção (própria e imprópria) traduz-se, por isso, numa manipulação do aparelho de Estado pelo funcionário que, assim, viola a autonomia intencional do último, ou seja, em sentido material, infringe as exigências de legalidade, objectividade e independência que, num Estado de direito, sempre têm de presidir ao desempenho de funções públicas».

[continua aqui]

Corrupção: algumas ideias

Ter estado hoje de tarde em Faro a falar sobre o papel das vítimas no crime de corrupção permitiu-me entender-me comigo quanto a um conjunto de ideias sobre esse tipo de ilícito:

primeiro, que a tipificação do crime é como se o considerasse o legislador um crime de enriquecimento, quando ele é afinal um crime de dano àqueles que não souberam usar o suborno como instrumento de geração da vantagem a seu favor; 

segundo, que só a manipulação das categorias conceituais - ditas dogmáticas - é que permite considerá-lo [como o fez a doutrina com aplauso na jurisprudência] crime de resultado e não de mera actividade, pois que se considera [para mim de modo insólito] como resultado o facto psicológico da oferta ou do pedido serem levados ao conhecimento da outra parte, quando o resultado tipicamente relevante se supõe ser algo tangível e valioso do ponto de vista dos interesses protegidos pelas normas legais;

terceiro, que na lei e na prática a corrupção é considerada como se fosse um crime em si, autónomo e sem contexto, quando ele é um crime instrumental do (s)  ilícito (s)  - tantas vezes criminosos - que se mercadejou (aram) em contrapartida do suborno e que bem poderiam ser objecto de perseguição em sede de concurso real com ele;

quarto, que o desenho típico introduzido nas normas legais - mesmo a partir de 2008 na que criminaliza a corrupção no sector privado pura e simplesmente escorraça a existência de vítimas do crime, e no entanto no plano de Acção Comum da União Europeia [de 2003] estava prevista uma formulação em que os elementos de substância [lesão à concorrência ou dano a terceiros] eram considerados como relevantes;

enfim, que não se diga que tratar-se de crime de acção penal popular [artigo 68º do CPP] é forma de habilitação da intervenção das vítimas, pois que do que se trata é de não terem estas, devido à formulação típica do crime em causa, estatuto de ofendidos e como tal nem a lesão de que foram vítimas por esse crime poder ser demandada em processo que o tome como objecto.

Enfim, mais houve. A ideia é demonstrar em que medida tudo concorre, neste contexto para a impunidade da corrupção. O texto vai ser publicado. Darei notícias do mesmo. Ficam aqui, em estilo telegráfico, algumas ideias e o agradecimento à organização do evento.

Proscrever a prescrição?

A prescrição [do procedimento criminal] é injusta para as vítimas, útil para os autores de crimes, faz parte da essência do Estado liberal. Na sua base estão duas ideias utilitaristas e uma moral: a primeira, a de que a Justiça ou é eficazmente tempestiva ou não o é; a segunda é que o Estado, que se desacreditou ao não conseguir resolver-se quanto ao crime é melhor esquecer-se dele, porque fica exposto ao opróbio da impotência enquanto durar a pendência e esta já foi castigo sobejante para quem esteve em risco de vir surgir, tardia mas inexorável, a longa manus da Justiça.
Claro que tudo é discutível. O próprio marquês de Beccaria, animado de propósitos humanitários para o seu tempo, encarou a segunda, mas com reservas. Cito-o da sua pequena grande obra sobre os delitos e as penas: «Quando se trata desses crimes atrozes cuja memória subsiste por muito tempo entre os homens, se os mesmos forem provados, não deve haver nenhuma prescrição em favor do criminoso que se subtrai ao castigo pela fuga. Não é esse, todavia, o caso dos delitos ignorados e pouco consideráveis: é mister fixar um tempo após o qual o acusado, bastante punido pelo exílio voluntário, possa reaparecer sem recear novos castigos».
O tema, porque cívico, tem vindo para as páginas dos jornais e mais comunicação social. As reacções são expectáveis. Cada leitor sente-se mais potencial vítima de um crime do que possível autor dele. E vota na imprescritibilidade quer do crime que o Estado deixou por perseguir, quer quanto ao que não tem dúvidas ser o crime de o Estado não ter sido capaz de perseguir.
O problema é quando o relativo se torna problemático. Ao ter defendido o "carrasco de Lyon", o responsável pela Gestapo naquela cidade, preso já na fase terminal da vida, o controverso advogado francês Jacques Vergès pediu certidão a todos os processos em que torturadores franceses tinham ficado impunes na Argélia por estarem prescritos os seus crimes. E argumentou que no caso do julgamento do nazi que defendia estava em causa a "Justiça dos vencedores", porque entendiam que aquele crime, porque era «contra a Humanidade» pertencia à categoria dos crimes imprescritíveis e de incriminação retroactiva.
Na pequenez do nosso quotidiano de uma coisa me lembro eu e vejo que tantos a esqueceram: quando aqui há uns anos, por causa de uma alteração que não foi feita ao Código Penal [artigo sobre a interrupção da prescrição] quando entrou em vigor o nosso Código de Processo Penal [que acabou com a «instrução preparatória»] milhares de processos criminais prescreveram. Concluiu-se que isso sucedeu porque há mais de dez anos que se arrastavam em fase de inquérito, ou seja, sem terem visto um juiz pela frente. Foram tempos fantásticos, esses, em que, por um momento, os que já então clamavam contra o alegado «excesso de garantismo» [na forma: são os advogados, com os seus expedientes, os culpados do atraso na Justiça] tiveram que baixar o cornetim da exclamação [porque no inquérito penal os advogados tinham em matéria de possibilidades de intervenção praticamente zero], tempos em que, para interromper a prescrição havia quem passasse e validasse mandados de detenção apenas para levar o detido ao juiz e fazê-lo soltar a seguir, interrompida por esta forma a prescrição, a liberdade cidadã como instrumento de salvação da incapacidade do Estado.
Cuidado, pois, com coisas sérias. Que de uma vez por todas se não legisle ao sabor das notícias.

P. S. Honra seja feita ao legislador da Lei n.º 32/2010, de 02.09 que decretou que prescreveriam em 15 anos os «crimes puníveis com pena de prisão cujo limite máximo for superior a 10 anos ou dos crimes previstos nos artigos 372.º, 373.º, 374.º, 374.º-A, 375.º, n.º 1, 377.º, n.º 1, 379.º, n.º 1, 382.º, 383.º e 384.º do Código Penal, 16.º, 17.º, 18.º e 19.º da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, alterada pelas Leis n.os 108/2001, de 28 de Novembro, e 30/2008, de 10 de Julho, e 8.º, 9.º, 10.º e 11.º da Lei n.º 50/2007, de 31 de Agosto, e ainda do crime de fraude na obtenção de subsídio ou subvenção». Quaisquer que sejam as críticas que mereça essa inovação essa reforma teve «por pano de fundo a criminalidade associada à corrupção», por se reconhecer que os prazos em vigor até então «eram patentemente reduzidos» [leia-se, porque muito interessante o estudo de José Manuel Damião da Cunha, A Reforma Legislativa em Matéria de Corrupção [editado em Abril deste ano pela Coimbra Editora].

As vítimas da corrupção

Por gentileza da organização intervirei, com uma comunicação, no próximo dia 6 de Dezembro, na conferência que terá lugar lugar, na Universidade do Algarve, organizada pelo DCIAP, sob o tema O Ministério Público e o Combate à Corrupção. Caber-me-à tratar a questão «dos direitos das vítimas no crime de corrupção». O programa pode ser consultado aqui. Em tese a corrupção tem como vítimas dez milhões de portugueses.

CEJ, Estudos sobre as reformas de 2010

O livro compila estudos efectuados no âmbito da actividade formativa do Centro de Estudos Judiciários. Tomam como objecto as reformas levadas a cabo em 2010 das leis penais e de processo penal [Lei n.º 26/2010, de 30.08 e Lei n.º 32/2010, de 2 de Setembro].

No âmbito penal (i) Cláudia Cruz Santos, analisa Os crimes de corrupção de funcionários e a Lei n.º 32/2010 (ii) Paulo de Sousa Mendes Os novos crimes de recebimento e oferta indevidos de vantagem (iii) e Euclides Dâmaso Simões Contra a Corrupção, as leis de 2010 e (iv) José Mouraz Lopes, Os novos crimes urbanísticos no Código Penal.

Em maior número são os ensaios no domínio do processo penal (i) Alfredo Castanheira Neves, A publicidade e o segredo de justiça no Processo Penal Português após as revisões de 2007 e 2010 (ii) José Damião da Cunha, Prazos de encerramento de inquérito, segredo de justiça e publicidade do processo, tema que é retomado por José Conde Ferreira e Nuno Catarino (iii) Carlos Pinto de Abreu, Prisão Preventiva e Detenção, tema que é estudado também por Mário Ferreira Monte e Flávio Noversa Loureiro, Vítor Guimarães, Artur Cordeiro, Ricardo Jorge Bragança de Matos e Francisco Mota Ribeiro (iv) Luís de Lemos Triunfante, Alterações ao processo sumário, matéria igualmente estudada por Helena Martins Leitão.

Sem beliscar

O Procurador-Geral da República, em discurso, num evento organizado pelo DCIAP disse três coisas:

Primeira, a propósito do MP: «O Ministério Público é composto por magistrados e, por isso, não pode esquecer regras essenciais da democracia».

Segunda, a respeito dos OPC's e outros órgãos da Administração: «Há, pois, que repensar o tipo de articulação e de colaboração entre o Ministério Público e aquelas entidades, potenciando o diálogo e a comunicação entre uns e outros, de modo a encontrar um ponto ideal de cooperação que, sem beliscar as atribuições próprias de cada um, permita a interacção necessária a um melhor exercício das mesmas – com todas as vantagens que daí advirão para a comunidade, para o cidadão e para uma melhor e mais atempada administração da justiça».

Enfim, sobre o enriquecimento ilícito, que: «É evidente que a figura do enriquecimento ilícito, a ser aprovada, facilitará a investigação de vários casos de corrupção, além de ser uma figura que é largamente popular, por ser evidente para grande parte da população que existem em Portugal claros casos de enriquecimento não justificado. Mas, não podemos esquecer, como magistrados que somos, que haverá que respeitar os princípios constitucionais do ónus da prova e da presunção da inocência. De nada servirá aprovar uma lei que os tribunais depois considerem inconstitucional. É fundamental conseguir o equilíbrio, o que, reconhece-se não é fácil».

P. S. Mais acrescentou que: «O Conselho Superior do Ministério Público remeterá à Assembleia da República o seu parecer sobre a projectada lei». [Não está aqui, onde estará?].